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- » [Concluída] [Fanfic] Destinos (por SaaChan)
#1 10-03-2015, às 10h28
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#2 11-03-2015, às 17h55
Classificação: +16
Tema: Romance, Suspense, Ação, Ficção
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Amanda Portland é uma garota comum que possui quinze anos, porém a vida da mesma muda quando uma família misteriosa se muda para a sua cidade, e com eles, estranhos acontecimentos fazem com que Shanksville entre em estado de alerta quando um animal desconhecido é visto rondando pelas redondezas do bosque vizinho à casa da família Portland.
Spoiler (Clique para visualizar)
Protagonistas
Amanda Portland
Link da imagem externa
Tem quinze anos e é conhecida pelo apelido de Maddy. Mora com o pai, Paul, e os dois irmãos gêmeos Richard e Gabe, em Shanksville. Adora passar seu tempo caminhando dentro do bosque vizinho à sua casa.
Gregory Hanson
Link da imagem externa
Tem dezesseis para dezessete anos, muda-se para a cidade com sua irmã mais velha Susan, de 32 anos e seu primo Alan de 16 anos.
Personagens Secundários
Alan Lins
Susan Hanson
Paul Portland
Jennifer Peroni
Sabrina Days
Angela Mesquita
Candace Clarke
Ashley Thorne
Drew Coleman
Carl Coleman
Pierre Russeau
Miguel Russeau
Irene Green
Richard e Gabe Portland
Christopher Ganté
Spoiler (Clique para visualizar)
Normalmente, histórias de contos de fadas começam com um “era uma vez”, mas a minha história não é um conto de fada, então acho que não preciso usar esse início brega – mesmo que a chapeuzinho vermelho o utilize. Na minha história não há ratos e sapos que se transformam em homens, nem carruagens que antes eram abóbora; as bruxas não têm poderes mágicos ou voam em vassouras, só dão aulas de literatura e francês. E as piores vilãs eram as garotas populares da escola, que se achavam as melhores por vestir roupas de marca cara.
Sou Amanda Portland, tenho quinze anos e moro em uma pequena cidade chamada Shanksville, no condado de Somerset, Pensilvânia. Meus pais não são camponeses, como na maioria dos contos, muito menos reis de grande palácio. Na verdade, meu pai é enfermeiro e minha, a qual se foi quando eu possuía apenas nove anos, era, pelo o que sei, apenas uma faxineira. Meus irmãos de seis anos, gêmeos, são de longe os menos educados. Mal sabem amarrar os sapatos e fazem pirraça quando meu pai diz que não comprará o cereal favorito deles. A única coisa que temos em comum são a cor morena da pele, os cabelos negros e o nariz comprido e fino por herança genética. Fora isso, mais nada.
E minha casa não era um grande palácio, com longas escadarias nas extremidades das paredes que levavam às grandes suítes como os dos nobres. Não havia um extenso porão onde uma princesa estaria trancada à espera de seu príncipe encantado que a levaria a um lugar muito, muito distante. Também não era casa da vovozinha, e não há uma longa torre onde uma garota com um cabelo incrivelmente longo estaria presa. Era uma casa normal, de dois andares e uma lavanderia no porão. Tinha um sótão que servia de lar para insetos e roedores e três quartos divididos entre mim, meu pai e meus dois irmãos. Pelo menos, havia uma lareira, mas não existia uma chaminé do lado de fora.
E o bosque era logo atrás da minha casa. À noite, era escuro e perigoso, mas ao dia, podiam-se ver alguns animais inofensivos escondidos por entre as árvores enquanto ia ao ponto do ônibus. Com uma caminhada não muito longa, você a atravessaria sem grandes problemas, e logo poderia ver o amplo estacionamento da minha escola. Três grandes prédios, uns ao lado dos outros. Eram altos, mas não largos, e tinham uma cor semelhante à casca do ovo. Felizmente, meus colegas de sala de aula eram humanos que usavam roupas, não animais falantes. Esses eram meus professores.
E o lindo príncipe encantado não vinha montado em um cavalo branco, com roupas brancas de tecido fino e medalhas no peito, nem ao menos uma coroa dourada e reluzente nos cabelos pretos naturais bem penteados tinha, mas ainda mais legal que isso, tinha um Mustang 500 GT de deixar qualquer outro carro parecendo uma lata velha. Era moreno, mas seus cabelos eram estranha e perfeitamente bem bagunçados, e ao invés de medalhas reluzentes, ele escondia um grande segredo...
Última modificação feita por SaaChan (01-05-2015, às 20h14)
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#3 11-03-2015, às 18h20
Capítulo I - Os Novatos
- Terra para Maddy! – Angela estalou os dedos frente aos meus olhos. Meus pensamentos aquele dia estavam num outro lugar qualquer. – Em que tanto pensa?
- Em nada importante. – Limitei-me a dizer, e assim, aquele assunto morreu tão rápido quanto nasceu. – Um milk-shake de morango, por favor. – Pedi à merendeira, dando-lhe o dinheiro de antemão.
- Ouvi alguns boatos de dois alunos transferidos. – Começou ela – Um pouco estranho alguém se transferir logo na metade do ano letivo, não é?
- Uhum. – Murmurei. – Obrigada. – Peguei meu milk-shake e nos sentamos em uma mesa qualquer perto da grande fonte que ficava no centro do colégio. Algumas garotas passaram por nós, nos olhando torto. Entre elas, reconheci rapidamente Candace, uma das garotas que eu mais odiava.
- Está prestando atenção? – Perguntou-me Angela, indignada.
- Claro! Continue.
- Então, dizem que são dois garotos que irão chegar. Irmãos, imagino. – Angela nem ao menos parou para respirar, apenas tomou-me o copo de milk-shake das mãos e bebericou um pouco dele. – Tomara que sejam solteiros e gatinhos.
Apenas soltei uma risada sem humor. Logo o sinal bateu e saímos em direção à sala de aula. O restante do dia fora normal, nada de interessante. Resolvi aquele dia pegar o ônibus escolar para voltar para casa ao invés de ir por dentro do bosque. Pelo caminho, olhando para a rua com um pouco de dificuldade – os vidros estavam embaçados por causa do frio que fazia – pude ver um caminhão de mudança, e ao lado, três carros em cores fortes.
Algumas pessoas ali carregavam caixas e móveis para dentro de casa. Entre eles, pude identificar facilmente os moradores: Dois garotos um pouco parecidos. Um deles possuía cabelos arrepiados, curtos e negros. Era alto, deduzi, e forte também. O casaco mal podia esconder os músculos dos braços. O outro, porém, era mais baixo e não tão forte quanto o primeiro. O cabelo castanho claro era um pouco mais comprido e estava preso no alto da cabeça em um rabo de cavalo. A única mulher do trio era alta, mas percebi que estava de salto. Vestia um terninho azul marinho, e tinha cabelos pretos, assim como o primeiro garoto, longos e lisos muito bonitos. Tentei ver-lhe os rostos, mas o ônibus virou na esquina e, pouco mais adiante, saltei em frente à minha casa.
Eu poderia dar alguns passos e xeretar um pouco. Saber quem eram os novos vizinhos. Mas resolvi ir para casa. Minha barriga roncava, era a hora do jantar.
- Chegou cedo. – Disse-me papai, da cozinha ao ver-me entrar. Estava vestido com o uniforme do trabalho – um conjunto de blusa e calça igualmente verde.
- Peguei o ônibus. – Coloquei minha mochila sobre a bancada que separava a cozinha da sala. – Tem plantão, hoje?
- Sim. – Senti o cheiro da omelete que ele fritava. – Vá guardar a mochila.
- Mas estou morrendo de fome. – Reclamei. Logo, minha barriga fez um grunhido estranho. – Viu?
- Então vá guardar a mochila, lavar as mãos e depois venha comer.
- Tudo bem. – Falei, desaforada. Ouvi, enquanto subia as escadas, uma risada irônica do meu pai.
Joguei minha mochila na cama e corri para o banheiro, lavando as mãos. Desci e sentei na bancada. Meus irmãos chegaram logo depois e sentaram nos lugares vagos, cada um ao meu lado. Eu não sabia identificar qual era qual com o uniforme da escola. O jantar foi omelete de brócolis. Se não estivesse morrendo de fome, eu não comeria de maneira alguma, mas daquela vez, deixei passar. Logo fui para cama – antes, claro, escovei meus dentes e tomei um banho – e rapidamente peguei no sono.
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O dia seguinte amanheceu chuvoso, com sons altos de trovões. O relógio marcava 5:42 da manhã, acordei três minutos adiantada. Decidi ficar na cama até o relógio despertar, o que, em minha opinião, passou mais rápido que o normal. Arrumei-me para ir à escola, verifiquei o celular e desci as escadas. Meu pai acabara de chegar. Vinha com a mochila em uma das mãos, e na outra a blusa do uniforme.
- Já está arrumada? – Perguntou, surpreso – Quer que eu faça algo para comer?
- Sim, adoraria panquecas. – olhei em meu celular – 6:36 – murmurei para mim mesma.
- Tem tempo, então coma devagar. – Ele pegou vários ingredientes para misturá-los.
Minha preocupação não era com a hora em si, mas se Angela viria me buscar em casa, ou se nos encontraríamos no ônibus. Eu estava em dúvida se iria a pé pelo bosque ou naquele ônibus torturantemente barulhento. O barulho da chuva e mais um trovão me disseram que eu não tinha opção. Iria de ônibus. Não muito tempo depois, meu pai chamou minha atenção. Meu café da manhã estava pronto, e eu tinha bastante tempo, então comi devagar.
A campainha tocou quando estava prestes a comer a última da panqueca. Corri para atender, dando de cara com Angela. O seu guarda-chuva e metade da calça jeans estavam molhados.
- Vamos logo, se não o ônibus vai sem a gente! – Mal acabou a frase e me puxou pelo braço.
- Espera, eu não acabei de comer!
- Come depois! – Peguei minha mochila e me despedi de meu pai.
Quando chegamos ao ponto, vimos o ônibus amarelo berrante vindo em nossa direção. Sentamo-nos em um banco aleatório e em menos de meia hora, chegamos à escola. Mal pisamos na calçada, pudemos ouvir do outro lado do estacionamento, comentários maldosos sobre nós.
- Nossa, o bicho do mato aprendeu a pegar ônibus, foi? – Disse Candace, arrancando risadinhas das amigas. Elas estavam sobre o carro prata dela, sentadas na lataria e ouvindo música alta.
- Acho que foi a baleia quem ensinou, não é? – disse outra garota, acho que seu nome era Ashley.
- Olha só, sua babaca! Eu... – Ela ia avançar sobre elas, mas a puxei, impedindo-a. – Me solta, Maddy! Eu vou ensinar uma lição pra essa cretina!
- Deixa pra lá, não vale a pena! – Tentei convencê-la. – Pra quê sujar as mãos com lixo?
Candace fechou a cara no mesmo instante, ela ia retrucar quando dois carros desconhecidos passaram por nós. Um deles era uma Mustang GT 500 azul marinho com duas faixas brancas no centro. A pintura metálica dava ao carro um ponto de encanto. O outro era um Camaro preto com faixas amarelas bem afastadas no centro. Os dois estacionaram logo ao nosso lado.
- Será que são os novatos? – Angela perguntou-me baixinho.
- Eu não sei. – Respondi-lhe, embasbacada.
Eles passaram por nós, como se estivessem num daqueles filmes em que todos abrem passagem para os poderosos. Todos olhavam para eles, mas um deles cruzou seu olhar com o meu. Seus olhos eram de um azul extremamente intensos, o rosto era comprido e o queixo um pouco quadrado; o nariz era longo e a boca um pouco carnuda. O outro que estava ao seu lado lhe deu um toque no braço, e então sua atenção voltou para ele.
- Que gato! – Angela se animou. – Ele ficou olhando pra você!
- E isso é assustador! – Exclamei. Meu estômago parecia uma maquina de lavar.
- Boba! –Deu-me um peteleco na testa. Reclamei, tentando devolver. – Vamos, antes que levemos uma detenção.
Chegamos à sala de aula a tempo. A professora Collins, uma mulher baixinha de cinquenta e dois anos, não parou de reclamar o nosso pequeno atraso em toda a aula de história. Os cabelos brancos, naquele dia, estava presos em um coque alto, o que significava que ela estava de mau humor. No final da aula, trocamos de sala. Eu para Química 2, e Angela para Álgebra 1. Candace tinha aquela aula comigo, e estar sozinha sem Angela por perto era perturbador.
- Tenho certeza que esta aula será muito legal, não é, meninas? – Candace falou, alto. A senhora Phillips sorriu para ela, realizada. Acredito que no final do semestre, seu boletim ganhará dois ou três pontos extras. Mas eu sabia que a mensagem era para mim. Seria uma longa aula.
Arrumei meu material em cima da mesa e coloquei minha mochila do meu lado no chão. Qual foi a minha surpresa ao ver um dos alunos transferidos sentado ao meu lado? Nossos olhares se cruzaram novamente, mas desta vez, eu desviei rapidamente. Minhas bochechas queimavam e minhas ações indicavam meu nervosismo. Mas eu sabia que ainda que eu não olhasse para ele, ele me observava.
Passados alguns minutos de aula, ele me chamou.
- Qual seu nome? – Disse baixo, perto de mim.
- Amanda. E o seu? – Disse, no mesmo volume de voz.
- Gregory, mas pode me chamar de Greg.
- Então me chame de Maddy. – Sugeri. Ele sorriu de lado. – Por que se transferiu no meio do ano?
- Problemas com a casa antiga. – limitou-se a dizer. – Vim de outra cidade, por isso a transferência.
- Hmm... – Me silenciei. Eu não tinha mais assuntos, mas ele tinha vários. A aula se passou com uma Candace olhando torto para mim e uma conversa interessante com Gregory.
Assim que o sinal do intervalo soou, nos despedimos cada um para um lado. Peguei meu dinheiro do almoço e entrei na fila para pegar um prato. Demorou um pouco até que eu enchesse a bandeja e pagasse à merendeira, mas logo eu estava sentada na mesa em que eu habitualmente me sentava junto com Angela e Jennifer, minhas melhores amigas. Foi somente pensar nelas que pude ver, ao longe, a cabeleira ruiva de Angela entre uma multidão pessoas. Junto à ela, estava Jennifer e Sabrina. As três sentaram-se a mesa: Jennifer ao meu lado; Angela e Sabrina à nossa frente, uma do lado da outra.
- Perdi as esperanças no novato, sabe? – Começou Angela, em meio aos suspiros - falsos - deprimidos. Revirei os olhos, como ela era dramática.
- Por quê? – Confesso que, mesmo não demonstrando, eu estava curiosa. Seria Gregory de quem ela falava?
- Ele é gay! – Angela falou tão alto que chamou a atenção das mesas mais próximas a nós. Senti meu rosto esquentar pelo constrangimento, mas Angela ignorou-os e continuou sua “triste” sina. – Começou assim: A Ashley à todo minuto ficava flertando com ele, ai quando a aula acabou e a gente teve que mudar de sala, ela foi dar em cima dele...
- E ele a cortou na hora... – Continuou Sabrina. Jennifer soltou uma risada, eu a acompanhei.
- Isso. – Concordou Angela. – E logo depois ele falou que era gay!
- Tem certeza que ele disse que era “gay”? Ele podia ter dito... Hmm... – Procurei, nervosa, uma palavra que rimasse com “gay” – “Sei”! – Falei tentando tirar aquela ideia da cabeça dela - e tentando não acreditar naquilo.
- Tenho! – Angela exclamou, indignada. – Eu não tiro conclusões precipitadas! Se eu disse que ouvi, é porque eu ouvi. E a Sabrina estava lá de prova.
- Verdade. – Afirmou Sabrina.
- Tudo bem, entendi. – Falei, me rendendo. Ergui as mãos em sinal de desistência.
- Ele era um gatinho! – Angela fez bico. Jennifer novamente riu, agora mais abertamente. Sabrina apenas mexia no celular, agora alheia à nossa conversa.
- E você sabe o nome dele? – Perguntei, curiosa. Precisava saber se a tal pessoa era mesmo Gregory, afinal, não tinha como eu saber se era ele ou não. Tínhamos apenas três aulas juntos, essas eram: Língua Inglesa, Espanhol e Física Avançada. Por esse motivo, eu não passava todo o tempo com ele.
- É Alan. – Respondeu Jennifer. – Acho que o sobrenome é Lins, se não me engano. – Angela parecia ter perdido a vontade de falar.
Senti-me aliviada por alguma razão, mas não deixei transparecer. Elas estranhariam e eu não queria falar sobre esse assunto, mesmo que fossem minhas amigas melhores amigas. E não era por não confiar nelas – eu confio, e muito! – era, na realidade, a vergonha que prendia as palavras em minha garganta.
Continuamos a conversar sobre qualquer coisa. Nosso principal assunto rondava sobre a “super incrível” viajem de Jennifer à Orlando e mais algumas reclamações de Angela sobre a opção sexual do novato, Alan. Não demorou muito para que o sinal soasse novamente, exigindo que todos os alunos voltassem às suas respectivas salas de aula. Despedimo-nos, cada uma para uma sala diferente e, depois de três longos tempos de aula – os quais se resumiam a quarenta minutos de gagueira por parte do Sr. Sommerhill e uma hora e vinte de sono na aula do Sr. Russo.
A escola se esvaziou rapidamente na saída. A chuva, ao contrário dos trovões, não havia dado trégua, obrigando-me a ir de ônibus na volta para casa. Esperei em baixo da cobertura que dava em direção ao estacionamento pelas minhas amigas, mas apenas Angela e Jennifer apareceram.
- A Sabrina vai com o irmão dela cuidar da floricultura. – Informou-me Jennifer. A família de Sabrina tinha uma floricultura bem popular no centro da cidade, porém era raro a Sabrina trabalhar lá, somente quando precisavam de ajuda. – A mãe dela está doente, então ela vai estar a substituindo.
- Tudo bem, então. – Respondi. – Quando chegar em casa, eu vejo se ligo para o celular dela. Agora vamos antes que o ônibus parta sem a gente.
Começamos a andar pelo estacionamento em direção ao ônibus amarelo mostarda que estava com as portas abertas. Ouvi o som de uma buzina, mas ignorei. Não pensei que fosse para mim até o Mustang azul marinho com faixas brancas parou ao nosso lado. O outro carro, um Camaro preto com faixas amarelas, passou em alta velocidade pelo estacionamento até alcançar a rua e desaparecer ao longo da estrada.
- Gregory? – Perguntei retoricamente, bem baixinho.
- Quer uma carona? – Ele perguntou, um sorriso de canto nos lábios. Levei um choque, mas tão rápido quanto eu me recuperei.
- Vai depender de onde você for me levar. – Brinquei, marota.
Ele deu uma gargalhada baixa. Pude ver os longos e pontiagudos caninos dentro de sua boca.
- Me ofende sua desconfiança em mim. – Ele fingiu estar ofendido e magoado.
- Desculpe, é a força do hábito. – Disse, marota. Por parte, aquilo era bem a verdade, eu tinha mania de desconfiar de tudo e de todos.
- Sem problema, você está certa em desconfiar. – Ele ajeitou-se no banco. – Vamos tentar novamente, ok?: Quer uma carona?
Eu estava tentada a aceitar, mas eu sabia que deveria recusar. Estava pronta para rejeitar o convite quando Angela se intrometeu.
- Ela quer sim. – Falou, empurrando-me já para dentro do carro.
Ela nem ao menos me deixara falar, bateu a porta do carro e, da janela mesmo, puxou-me pelo braço para falar no meu ouvido.
- É melhor você me contar TUDO depois, entendeu? – Disse, em tom de ameaça. – Tchau, Maddy. – Chamou-me pelo apelido carinhoso.
Vi-o engatar a primeira marcha e acelerar. Fui obrigada a colocar o cinto de segurança – ele dirigia em alta velocidade. Ele riu da minha reação. Em menos de dois minutos, estávamos em frente a casa que vi no dia anterior os vizinhos descarregando o caminhão de mudança.
- Você mora aqui? – Perguntei, mesmo sendo óbvia a resposta.
Ele apenas assentiu, tirando do porta-luvas uma caixa de madeira longa e esculpida. Logo o outro novato saiu de casa e andou em nossa direção. Apenas cumprimentou-me e depois, sem dizer nada, pegou a caixa de Gregory e olhou dentro. Agora eu estava curiosa, mas eu repetia mentalmente para mim mesma que aquilo não era da minha conta.
- Está faltando dois. – O outro falou.
- Fiquei com fome. – Respondeu-lhe Gregory.
- Vai me indenizar depois.
- Vou ver se posso. – Sorriu-lhe de lado, maroto. – Vejo você depois.
- Até. – Despediu-se o outro e voltou para dentro de casa.
Ele acelerou novamente e eu lhe dei as direções corretas para chegar à minha casa. Assim, quando chegamos, ele me levou até a porta, como em um daqueles filmes românticos em que o cara leva a garota até a porta de sua casa e começam um diálogo, seguido de um beijo calmo e terno. Porém, felizmente – ou infelizmente – a porta se abriu antes que pudéssemos começar a falar.
Olhamos ao mesmo tempo para o homem que abrira a mesma. Era meu pai, e ele não parecia nada contente em ver um garoto desconhecido ao meu lado.
Capítulo II - Sombras
- Boa noite. – Disse papai. Ele olhava fixamente para Gregory, a fim de intimidá-lo. No mesmo momento, senti-me tensa e envergonhada, mas Gregory não parecia nada afetado pelo olhar do meu pai.
- Boa noite, Sr. Portland. – Cumprimentou-o, Gregory. – Vim trazer a Maddy para casa, já que ela perdeu o ônibus. – mentiu.
- Tudo bem. Amanda, entre antes que pegue um resfriado. Se despeça logo do seu amigo. – Ordenou-me papai. O mesmo continuou na porta nos observando de perto, a cara fechada.
- Até amanhã, Greg. – Despedi-me, um tanto envergonhada pela má educação do meu pai.
Porém, ao invés de apenas se despedir e ir embora, Gregory beijou-me a bochecha esquerda e falou “Até”, antes de entrar no carro e sair em alta velocidade. Entrei em casa sem olhar para meu pai e fui para o meu quarto, muito irritada, ele fechou a porta com certa brutalidade.
- Amanda! – Gritou, irado. Ignorei-o enquanto guardava o meu material. Ouvi os passos pesados dele subindo as escadas e parando logo na porta do meu quarto. – Amanda, quem era aquele garoto?
- Um amigo. – Respondi, curta e grossa. Sentei na cama tirando os sapatos.
- Amanda, você sabe que... – o interrompi, abusada.
- Eu disse que ele é um AMIGO! Será que eu vou ter que soletrar? – Gritei, enfrentando-o. – E também, se fosse ou não meu namorado, isso não é da sua conta!
- Você está sob o meu teto, Amanda, é da minha conta, sim!
- Estou aqui por não ter opção! – Encarei-o, aproximando-me. Senti meus olhos e meu nariz arderem. Eu nunca em toda vida havia brigado com meu pai desta maneira. – Por que se eu tivesse dezoito, eu arranjaria alguma grana e te abandonaria como a mamãe fez!
No momento em que disse aquilo, me senti totalmente arrependida e culpada. Sabia que aquele assunto era doloroso para meu pai, por esse motivo nós nunca falávamos sobre minha mãe. Eu tinha vontade de pedir perdão de joelhos se fosse preciso, mas eu não diria naquela hora. Ele tinha que perceber que eu não era mais criança. Ele não disse nenhuma palavra. Um silêncio torturante se instalou no meu quarto e o clima era tão tenso que podia ser apalpado no ar. Em silêncio, dirigiu-se a porta, mas antes de sair por ela, ele falou sem olhar em minha direção.
- Está de castigo por uma semana. – Eu esperava algo pior. Algo como “eu estou decepcionado” ou qualquer coisa parecida. Uma semana de castigo não me faria diferença, eu mal saía de casa, ainda mais com o tempo chuvoso que se instalara em Shanksville por essas semanas.
Depois disso, fechei a porta com força sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Troquei de roupa rapidamente e então me joguei na cama, me escondendo debaixo do edredom macio. Coloquei uma música triste em meu MP4. Uma das minhas favoritas, chamava-se My Immortal da banda Evanescence. Era calma e triste, uma música perfeita para acabar de vez comigo. E sem perceber, acabei adormecendo.
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Acordei faminta naquele mesmo dia. Olhei em meu despertador. Faltava quinze minutos para meia-noite. Levantei da cama e calcei os chinelos, espreguiçando-me em seguida e logo depois, saí do meu quarto indo em direção às escadas. Desci na ponta dos pés, afim de não acordar ninguém com meus passos, mas havia alguém assistindo a TV na sala. No mesmo momento em que meus pés tocaram a madeira do piso inferior, o mesmo fez um ruído baixo atraindo a atenção de quem estava ali. Era meu pai.
- Não se preocupe, só vim pegar um biscoito e logo voltarei para a cama. – Respondi breve, indo até a cozinha pegar o pote de biscoito e o leite na geladeira.
- Espere, Maddy. Venha até aqui. – Pediu-me gentilmente. Estava relutante, mas me sentei ao seu lado no sofá de dois lugares.
Olhei para a TV por um instante e reconheci pelas imagens o vídeo do meu aniversário de nove anos. Naquela época, estávamos todos reunidos como uma família feliz. Em uma cena, o bolo de chocolate caseiro estava com velas acesas sobre o mesmo, e toda a família – papai, avôs, avós, tias e primos – cantavam juntos “Parabéns para Você”. Eu estava em cima de um banquinho, os dentes da frente tinham caído, então dava para se ver minha língua com facilidade. Ri de mim mesma.
Foi então que quando a música terminou e as velas se apagaram, uma mulher de pele morena e olhos verdes se abaixou ao meu lado no vídeo. Perto dela, estava um carrinho de bebê para gêmeos, dois bebês neles. Eram meus irmãos. Eles aparentavam ter uns dois ou três meses. E a mulher era minha mãe. No mesmo instante em que se virou para mim, eu desviei o olhar. Por um lado, eu a odiava; por outro, sentia saudades, porém ambas as partes a culpavam pelo sofrimento que ela fez meu pai passar. Que ela me fez passar.
- Por que está vendo isso? – Perguntei. Ajeitei-me confortável no sofá, sentando por cima de meus próprios pés.
- Por que é importante para mim. – Confessou. Ele batia levemente na perna, o controle do DVD. – Parte por sua mãe estar nele, parte por você estar nele.
- Me desculpe pelo o que eu disse mais cedo. – Disse, sincera. Eu realmente estava arrependida.
- Não se preocupe, já passou. – Ele passou um de seus braços sobre meu ombro, trazendo-me para mais perto. Encostei minha cabeça em seu ombro e ele beijou carinhosamente o topo da minha cabeça. Fechei os olhos sentindo-o afagar meus cabelos.
- Me conte a história de como se conheceram? – Pedi. Eu conhecia a história de cor, mas eu gostava de ouvi-la. – A verdadeira, por favor?
Ele hesitou por um segundo. Desligou o DVD e ajeitou-se no sofá, deixando que eu deitasse em seu colo.
- Nos conhecemos no ensino médio. Eu era um repetente por um bom motivo – larguei a escola para trabalhar e ajudar a pagar algumas contas em casa quando meu pai foi internado; ela havia acabado de entrar. Ficamos na mesma sala no primeiro ano e um amigo nosso em comum nos apresentou. Tornamo-nos amigos íntimos e logo depois, começamos a namorar. Meus pais desde o início eram contra a nossa relação por sua mãe ser negra, com os pais dela não era diferente, mas com o passar do tempo aprenderam a se tolerar.
- E depois?
- Eu entrei no basquete no terceiro ano. Eu tinha dezoito anos e uma pessoa muito importante de uma faculdade estava interessada em mim. Eu tinha que vencer o campeonato e, assim, ganharia uma bolsa pra fazer faculdade de basquete. Sua mãe nunca deixou de me apoiar. No dia do campeonato, uns garotos do time adversário me trancaram dentro do armário. – Ele riu. Olhei-o por um momento enquanto o mesmo coçava a bochecha. – Meu time perdeu o jogo e eu uma chance de cursar basquete em uma das melhores universidades dos Estados Unidos.
- Sinto muito.
- Eu também sinto. – Ele afagou novamente meus cabelos. – Naquele mesmo dia, descobri que sua mãe estava grávida de você. Eu tive que arranjar um emprego rápido, juntar dinheiro e finalmente me mudar da casa dos meus pais. Daí, você nasceu.
A história que eu conhecia terminava ali, mas eu sabia que tinha muito mais coisas do que apenas aquilo.
- Tivemos bastantes problemas, discussões... Separamo-nos e voltamos muitas vezes.
- Eu me lembro. – Disse, lembrando-me das várias brigas que presenciei.
- Desculpe.
- Não precisa agora. Apenas continue a história.
- Uns nove anos depois, tivemos os gêmeos. E conseguimos com muito custo fazer a sua festa de aniversário.
- Eu adorei. – Ri, lembrando-me. Uma festinha com apenas os amigos íntimos era bem o meu estilo.
Ele sorriu, mas eu sabia que por detrás daquele sorriso ele escondia um pouco de amargura.
- Fico feliz. – Disse, sincero. Depois continuou a história. – Naquela época a gente fazia de tudo para não brigar, sempre conversávamos para nos entendermos, mas parece que não foi o suficiente. Alguns meses depois que você completou nove anos, sua mãe disse que não suportava mais ficar comigo. Que a culpa era minha.
- Não é sua culpa. – Falei rapidamente.
- Não, não. Parte disso foi minha culpa sim, eu só percebi agora o quanto eu sufocava a sua mãe, que eu não dava liberdade à ela. Eu não confiava nela. Eu estava fazendo a mesma coisa com você, desculpe. Parece que eu não vi que você cresceu.
- Era o que eu queria que você percebesse. – Falei, sincera. – Queria que conversássemos mais, sabe? Acho que isso seria bom para nós confiarmos um no outro.
- Acho que seria um bom começo. – Ele sorriu de lado. Sentei no sofá e o abracei.
- Eu te amo, pai. – Confessei entre o abraço.
- Eu também te amo, Maddy. – Ele beijou o topo da minha cabeça. Logo nos separamos. – Já é tarde. – Ele olhou no relógio de pulso que usava. – Acho melhor comer alguma coisa e ir para a cama.
- Tudo bem. Quer biscoito? – Ofereci. Ele apenas meneou a cabeça em sinal negativo.
Comi rapidamente os biscoitos, acompanhados de um pouco de leite com achocolatado. Logo, assim que terminei, escovei meus dentes no banheiro, coloquei meu pijama e fui dormir.
Ao contrário do que o programa do tempo previu, o dia seguinte amanheceu com um lindo sol despontando no céu, o mesmo estava limpo, sequer havia uma nuvem passageira. Parecia que a sexta-feira iria ser bastante agradável, levando em conta que as aulas iriam começar mais tarde naquele dia.
Acordei às cinco e quarenta e cinco, como sempre. Levou uns quinze minutos para que eu despertasse completamente e começasse a agir. Separei em cima da cama o meu uniforme escolar. Naquele dia, eu trajaria uma saia junto com a blusa social e o suspensório. Parecia que iria fazer bastante calor. Coloquei dentro da bolsa minha roupa de ginástica: Uma legging preta e uma blusa de alças largas colada no corpo na cor branca. Coloquei o tênis dentro da mochila, junto com a roupa e separei meus cadernos de Química.
Tomei um banho um pouco demorado e coloquei uma roupa confortável, para ficar em casa. Peguei meu MP4 e comecei a escutar música, logo descendo as escadas, indo direto para a cozinha tomar café da manhã.
- Não está uniformizada? Vai se atrasar para a escola. – Disse-me papai. Ele fritava bacon em uma frigideira e punha sal nos ovos ao mesmo tempo.
- Eu entrarei mais tarde, hoje. A diretora avisou-nos que a professora de Geografia estava de licença por estar doente. – Roubei uma torrada de um dos pratos que ele havia preparado.
- Tudo bem, mas não vá se atrasar. – Avisou-me.
- Pode deixar! – Sorri, comendo rapidamente a torrada.
Logo depois do café ficar pronto e meus irmãos entrarem na sala, sentando-se um ao lado do outro na bancada da cozinha, comemos todos juntos. Meu pai era um ótimo cozinheiro, e os bacons estavam uma delícia. Assim que terminamos, meu pai pediu que eu levasse os meninos ao ponto de ônibus, o que fiz sem muita vontade. Saí de casa com os dois e paramos no ponto de ônibus. O ônibus escolar verde e pequeno chegou alguns minutos depois, parando à nossa frente.
- Boa aula. – Sorri irônica. Os dois fecharam a cara e embarcaram no ônibus xingando-me baixinho. Ignorei-os, voltando para casa.
Assim que pus os pés em casa, meu pai apareceu na sala com o uniforme verde do hospital. Ele procurava por algo.
- O que foi? – perguntei.
- Esqueci onde pus as chaves. – Revirei os olhos indo até a cozinha. As chaves estavam em cima da geladeira, naquele dia.
- Aqui. – Entreguei-lhe.
- Obrigado. – Agradeceu. Tomou a mochila em mãos e saiu apressado de casa. – Não vá perder a hora.
- Pode deixar. – Falei. Ele fechou a porta e a trancou pelo lado de fora.
Sempre quando meu pai saia de casa, ele fazia algo na cozinha antes e esquecia algo por lá. Parecia até uma mania dele. Desta vez foi a chave em cima da geladeira, da outra vez foi a pasta com alguns documentos em cima da pia.
Subi para me arrumar e depois desci. Fiquei um pouco no computador antes de sair de casa, trancando a porta. Eu decidi ir pelo bosque ao invés de pegar o ônibus aquele dia. Assim, fui para os fundos da casa e pulei a cerca que separava a minha casa das enormes árvores de troncos grossos. Adentrei-a sem medo algum. Ao contrário de muitas garotas, eu não tinha medo de pequenos animais selvagens ou insetos, eu não cresci com esse tipo de frescura.
Haviam se passado uns vinte minutos de caminhada quando ouvi alguns passos por perto. Procurei pelo lugar de onde vinha o som e vi um cervo correndo por entre as árvores. Aquilo parecia um mau sinal. Corri rapidamente para sair do bosque quando tropecei em uma raiz e caí. Naquele momento, eu vi, pendurado em uma árvore de galhos baixos logo acima de mim, a carcaça quase toda devorada de cervo grande.
Agora eu estava realmente apavorada. Tinha sangue de cervo em meu uniforme, pois o mesmo estava pendurado acima de mim. E eu pude ver, com dificuldade, sombras passarem por entre as árvores em uma velocidade sobre-humana. Voltei a correr, desta vez, com dificuldade. Minha perna doía por causa do tombo que levei, e, mais a frente, consegui chegar à rua da minha escola.
Atravessei-a. No caminho, quase fui atropelada por uma minivan, e adentrei a escola desabando em um grande banco perto da portaria. Uma das secretárias veio me atender.
- Meu Deus, o que aconteceu com você? – Perguntou, pasma com o meu estado.
Contei-lhe tudo o que vi e o que aconteceu dentro do bosque. A mesma me perguntou o porquê de eu utilizar aquele caminho para vir para escola e eu lhe respondi que era por que eu não gostava de pegar ônibus. Outra secretária apareceu junto com o diretor, e logo depois o corredor se encheu de alunos e professores curiosos . Assim que o diretor chamou meu pai e a polícia, eu vi, de dentro da escola, dois carros conhecidos entrarem no estacionamento.
Não demorou muito para que Gregory e o garoto que, no outro dia, ele havia dado uma caixa misteriosa, entrarem na escola. Gregory se agachou ao meu lado enquanto o garoto passou por nós sem demonstrar qualquer interesse ou curiosidade pela minha situação. Mas antes que pudéssemos começar um diálogo, a secretária pediu para que ele a ajudasse a me levar à enfermaria.
- Também não precisa de tanto! – Exclamei. Gregory me pegara no colo com tanta facilidade que parecia estar carregando um pedaço de papel. Puxei a saia para o meio das pernas, naquele dia, infelizmente, esqueci-me de vestir um short por baixo da mesma.
Gregory sorriu de lado, dando de ombros. A secretária achara desnecessário acompanhar-nos até a enfermaria, pois havia voltado a seus afazeres antes de fechar os portões que davam para o pátio. Assim que entramos na enfermaria, uma enfermeira pediu para que Gregory me pusesse na cadeira.
Senti um bocado de dor, confesso. Eu havia torcido o tornozelo e distendido o músculo da perna esquerda. Eu não poderia andar por algumas semanas, pouco mais de um mês. Em todo momento, Gregory permanecia ao meu lado. Pergunto-me se ele não se importava em matar aula – o que consequentemente resultaria em uma detenção de, no mínimo, uma hora.
- Não se preocupe com isso. Uma ou duas horas a mais na escola não me fará diferença. – parecia que ele havia lido meus pensamentos. Só então percebi que havia dito meus pensamentos em voz alta. Corei mais uma vez pela vergonha.
Cocei a cabeça, sentando-me melhor na cadeira.
- Eu estou um pouco curioso. – Disse-me Gregory. – O que aconteceu?
- Sinceramente, eu mesma estou tentando entender. – Confessei. – Eu estava vindo para cá pela floresta quando vi um cervo correndo. Não me pareceu um bom sinal, então eu corri e acabei tropeçando em uma raiz alta. – cocei a cabeça meio marota. – Acho que até pra me salvar eu sou bem desastrada. – Ri de mim mesma.
- Acontece. No desespero, a gente não presta atenção em nada. – Sorriu-me de lado.
Um silêncio constrangedor se instalou por alguns segundos. Eu me via perdida na imensidão dos olhos cor de mel dele. Pigarreei voltando a contar o que havia acontecido antes que fizesse algo idiota.
- Havia um cervo grande pendurado nos galhos da árvore logo acima de mim. – lembrei-me, arrepiando-me com a lembrança dos olhos sem vida do cervo olhando para mim. – Eu vi umas sombras passando pela floresta, sombras grandes e rápidas, então fiz de tudo para fugir. Ai, eu cheguei aqui.
- Sombras? – Ele parecia bastante intrigado.
- É. – Mordi o lábio inferior. – Não as vi direito, estavam correndo muito rápido. Eram grandes, sabe? Eram altas e pareciam andar somente em duas patas com o corpo inclinado. Algo assim.
Ele parecia refletir, e isso me deixou nervosa. Por um momento, achei que ele pensava que eu estivesse mentindo, mas era a pura verdade. A enfermeira chegou antes que eu pudesse perguntar o que ele pensava.
- Aqui, pegue e tome um banho. Está imunda e preciso que esteja limpa para cuidar do machucado. – Ela me entregou uma toalha e um uniforme de ginástica. Rapidamente pus-me de pé com a ajuda de Gregory.
- Obrigada. – Agradeci aos dois, logo me despedindo e indo em direção ao banheiro da enfermaria.
Tomei um banho rápido, lavando os cabelos do jeito que dava e, logo depois, vesti o uniforme. Saí do banheiro mancando e me deitei em uma maca. Olhei em volta, à procura de Gregory, mas ele já havia ido embora.
Capítulo III - O Bosque
Passei os olhos pela enfermaria novamente na esperança de vê-lo, pelo menos, sentado em uma cadeira meio distraído com alguma coisa. Mas só havia um garoto dormindo em uma cama distante da minha e a enfermeira procurando algo na geladeira. Estava distraída quando a mesma se aproximou de mim com uma bolsa de gelo, colocando-a sobre minha perna.
- Aquele garoto que veio comigo... Ele foi embora? – Perguntei a ela, timidamente.
- Sim. A responsável dele veio buscá-lo, eu acho. Ou talvez só tenha vindo falar com ele. – Respondeu-me, pressionando levemente a bolsa de gelo sobre minha perna. O frio começava a me incomodar. – Ele é seu namorado?
Corei com a ideia. Rapidamente neguei muito envergonhada.
- Não, ele é só um amigo. – Sorri timidamente. – Na verdade, eu o conheci há pouco tempo.
- Oh, então, eu posso investir nele? – Acho que a minha cara de surpresa fora muito engraçada pois a mesma começou a rir de mim. – Estou brincando. Olhe, sou casada. – Mostrou-me a aliança.
- Então, por quê? – Senti a respiração falhar enquanto me recuperava do susto.
- Queria ver sua reação. – Ela riu um pouco mais. – Para uma amiga, sua reação foi bem suspeita. – Ela sorriu de lado, um pouco maliciosa.
- Eu só... Fiquei surpresa com o seu interesse em alguém tão mais novo que você. – Controlei minha voz para não mostrar ansiedade, porém sem sucesso.
- Ora, eu nem sou tão velha assim. Tenho 20, quase dois ou três anos mais velha que você, certo?
- Na verdade, tenho 15 ainda. – Respondi com um sorriso tímido.
- É, parece que eu sou bem mais velha. – Ela riu de si mesma. Acompanhei-a.
Continuamos conversando por horas até que meu pai chegou para me levar para o hospital. Lá foi dito a mesma coisa, que eu havia torcido o tornozelo e teria que usar uma tala para o pé ficar no lugar. O médico me deu um atestado para poder faltar aula pelos próximos 15 dias, pois eu precisava de repouso. Logo, voltamos para casa de táxi. Meus irmãos nos esperavam do lado de fora de casa, pois não tinham a chave para entrar. Por um momento, senti pena deles tremendo de frio, mas isso foi até ver o sorriso mal-intencionado que traziam no rosto. Já havia percebido que as “férias” não seriam nada agradáveis.
- Quer ajuda? – Perguntou-me papai quando olhei com um pouco de medo para a escada.
- Seria uma boa. – Sorri de lado. Ele me ajudou a subir as escadas e carregou minha mochila até o quarto. – Obrigada.
- Maddy, acho melhor não ir para escola pelo bosque nunca mais, entendeu? – Avisou-me papai.
- Entendi. Eu não vou mais para lá. – Sorri de lado, o reconfortando.
- Certo. – Suspirou fundo. – Agora, se não se importa, eu queria saber o que aconteceu.
- Pensei que o diretor tivesse dito a você. – Franzi o cenho.
- Disse somente algumas partes relevantes. Quero ouvir de você. – Insistiu.
Novamente contei toda a história. Meu pai parecia bastante surpreso e um pouco preocupado. Nunca um animal daquele tamanho havia aparecido pelas redondezas de Shanksville, e a guarda florestal parecia muito preocupada com os habitantes. Enfim, quando o relógio apitou às nove horas, dormi rapidamente. Fora um dia bem longo aquele.
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Duas semanas se passaram desde o incidente. Já estávamos na metade do mês de setembro quando os primeiros quinze dias do atestado haviam vencido. Novamente, tive de ir ao hospital fazer um exame de rotina para tirar mais um atestado e logo depois, junto com meu pai, voltei para casa. Eu passava a manhã dormindo ou vendo televisão, quando meus irmãos iam para a escola. À tarde, eu cuidava deles – ou pelo menos tentava – com a ajuda de uma amiga da família. Seu nome era Kimberly – ou Kim, como costumávamos chamá-la. Tinha cinquenta e dois anos, morava sozinha e tinha cheiro de erva de gato, além de um pulso forte para o autoritarismo. À noite, felizmente, eu podia descansar sem ser perturbada. Meu pai saia mais cedo para dar-me os devidos cuidados de um enfermeiro. E minhas amigas me visitavam todos os dias, traziam os deveres da escola e alguns recados de Gregory, o que, no final, me deixava bem animada.
Mais cedo naquela manhã, meu pai fritava alguns ovos estrelados e bacon para nós. O cheiro bom de café da manhã se estendia até onde podia alcançar.
- Eu quero! – Gritei da sala, meu pé torcido ainda com a tala estava apoiado no braço do sofá.
- Já está ficando pronto. – Respondeu-me. Eu podia jurar que naquela manha ele estava com um bom humor um pouco suspeito.
Poucos minutos depois, eu já estava comendo meu café da manhã.
- Você está mais “radiante”. Aconteceu algo que o deixou de bom humor? – Perguntei indiferente.
- Nada demais, para falar a verdade. – Respondeu-me breve – Apenas conheci uma pessoa diferente.
Eu sabia o que aquela pessoa tinha de diferente, porém deixei aquela conversa morrer ali.
- Maddy, preciso ir ao supermercado hoje, queria que cuidasse dos meninos. – Logo hoje?
- Eu posso ir com você? – Perguntei. Domingo era dia de folga de Kim e os gêmeos, e eu não estava disposta a cuidar deles naquele dia. – Posso?
- Eu não tenho com quem deixar os meninos, Maddy. Você terá que cuidar deles.
- A gente os leva. – Fiz bico, pidona. – Por favor!
- Tudo bem, mas terá de ficar de olho neles por mim. – Cedeu. Sorri e afirmei com a cabeça.
- Pode deixar.
Mais tarde, todos nos arrumamos, pegamos o ônibus e logo descemos no supermercado. Esperávamos meu pai pegar um carrinho de compras do lado de fora do supermercado para que fizéssemos nossas compras semanais. Eu não esperava que meus irmãos me obedecessem, mas eles já haviam sido alertados de que se não o fizessem, iriam receber um castigo doloroso, o que, no fim, me deixava de muito bom humor.
Passaram-se alguns minutos de compras quando meus irmãos quiseram fazer a primeira arte. Os dois decidiram correr pelo mercado e acabaram derrubando algumas coisas das prateleiras. Com muito custo, eu havia conseguido agarrar um pela gola, mas o outro quase havia corrido para outro setor quando foi barrado por uma pessoa conhecida.
- Ei, não corra assim por aí! - Falou para Richard. A voz grave era de Gregory, no mesmo instante em que Richard voltou para meu lado, os nossos olhares se cruzaram. – Maddy!
- Oi, Gregory. – Sorri timidamente.
- Greg... – Corrigiu-me. – E então, seu tornozelo melhorou?
- Bastante, para falar a verdade. – Confessei. – E como você está? Conseguiu se enturmar?
- Não foi difícil, mas não há pessoas com que eu me sinta a vontade.
- Hmm, uma delas deve ser a Candace, não é?
- Exatamente. – Sorriu de lado.
Depois disso, um silêncio se instalou. Ele pegou um cereal da prateleira. Só então percebi a grande quantidade de carne que ele trazia dentro de uma cesta.
- Vai fazer um churrasco? – Perguntei, tentando arranjar um assunto.
Ele olhou para a cesta, depois olhou para mim, assentindo com a cabeça.
- Basicamente isso. – Respondeu-me.
Ouvimos duas vozes virarem no setor em que estávamos. Uma delas reconheci imediatamente, era meu pai. A outra era feminina, eu não a conhecia. Dei um cento e oitenta no mesmo lugar, assistindo, acompanhada do meu pai, uma mulher de cabelos longos e pretos, conversar animadamente com ele. Ela tinha olhos azuis e uma aparência bem parecida com a de Gregory.
- Gregory, pegou a carne? – Perguntou, a mulher.
- Peguei sim, Susan. – Mostrou a cesta.
- Maddy, esta é a Susan, ela se mudou há pouco tempo para cá. – Ela sorriu, mesmo que eu sentisse que ela não havia gostado de mim.
- Eu soube o que aconteceu, Greg me contou. – Falou. Eu imaginava qual a ligação entre eles. Ela mal devia passar dos vinte anos, e Gregory parecia ter mais de quinze.
- Contou? – Olhei para ele.
- É, eu contei. – Ele coçou a cabeça, sorrindo de lado meio envergonhado. Era a primeira vez que eu o via assim. – Espero que não tenha se importado, eu não escondo nada dos meus irmãos. – Então, eles eram irmãos? Parecia que ele havia lido meus pensamentos. – Ainda mais por que parecia algo importante.
- Claro! Um animal selvagem solto por aí, é algo para que toda a vizinhança tenha que ficar alerta! – Susan falou, olhando para Gregory, e logo depois para mim.
Naquele momento, Gabe e Richard, meus irmãos, agarraram minha perna boa, fazendo com que eu quase caísse. Eles pareciam temer algo, mais especificamente, alguém. Pareciam não gostar de ou Susan de Gregory. Gregory, naquele momento, sorriu para eles como se tentasse reconfortá-los, porém, sem êxito.
- Concordo plenamente. – Respondeu, meu pai.
- Susan, já vai dar sete e meia. – O outro irmão de Gregory apareceu. Ele parecia preocupado. Ele vinha com mais carne em duas cestas.
- Bom, Paul. – Ela beijou a bochecha direita do meu pai. – Espero nos encontrarmos em breve. Melhoras... Samira? - Perguntou
- Amanda. – Corrigi. Ela me jogou um beijo e outro para os gêmeos.
- Desculpe. Até, então. Vamos, Gregory. – Chamou-o
- Tchau, Maddy. Até, senhor Portland. – Despediu-se, virando em outro setor.
- Pai? – Chamei-lhe a atenção. Ele parecia estar viajando naquele momento.
- Sim? – Ele demorou um pouco para responder.
- As compras. – Disse, como se fosse óbvio.
Depois de terminarmos de fazer as compras e pagá-las, pegamos um táxi de volta para casa. Tivemos a ajuda do taxista para levar as compras para casa, e depois, guardamos as coisas no lugar. Richard e Gabe pareciam estar com bastante energia, pois não paravam de correr pela casa. Eu estava em meu quarto quando o relógio apitou oito da noite em ponto. Olhei para fora da janela, aquela fora a primeira vez que eu havia saído de casa desde o incidente, e eu sentia falta de caminhar por dentro do bosque.
Eu sabia que depois do que aconteceu, eu devia evitar passar perto daquele lugar, mas desde que eu era pequena, eu amava aquele bosque. Eu conhecia cada pedacinho dele. De tanto me perder ali, eu acabara aprendendo o caminho de volta para casa e o atalho para chegar à escola. Não era difícil, e isso me rendera bastantes títulos quando eu era raposa no clube de escotismo.
Decidi então dar uma volta pela área dos fundos. Coloquei uma sapatilha em um pé e uma calça de moletom. Desci as escadas e saí pela porta dos fundos, indo para a área dos fundos. A piscina estava descoberta e os brinquedos estavam espalhados pela grama. Tive de me desviar de um macarrão para não escorregar. Apoiei-me na cerca que separava minha casa do bosque, olhando para dentro dela. Já havia anoitecido, somente a luz da lua cheia iluminava, com dificuldade, um pouco o caminho que eu normalmente fazia para ir à escola. As folhas no topo das árvores dificultava essa façanha.
Um uivo soou bem próximo. Caminhando bem lentamente em minha direção, um lobo grande, maior que lobos normais, veio se aproximando. Seus olhos brilhavam sob a pouca iluminação e seus caninos estavam à mostra, enquanto seus lábios tremiam ameaçadoramente. O pelo era tão negro que era quase impossível conseguir vê-lo, era como se estivesse camuflado na escuridão que se apossava do bosque. E ele sequer fazia um ruído enquanto se aproximava.
Eu não conseguia me mover. O medo que eu sentia naquele momento, um medo muito pior do que eu senti quando aquelas sombras passaram por mim, me deixava paralisada. Eu podia ver minha vida passando pelos meus olhos, o suor correndo frio pela minha pele e o sangue deixando de correr dentro do meu corpo. Ele rangeu os dentes pronto para atacar, ficou de pé por um longo tempo. Nesse momento, eu percebi que fora aquele animal que eu vi correr por dentro do bosque. Ele impulsionou-se nas patas traseiras e deu um salto bem alto.
Naquele momento, eu fechei os olhos e me encolhi. Foi a única ação que tive antes de esperar a minha morte. Mas o som alto de madeira se partindo fez com que eu percebesse que o ataque do animal havia sido malsucedido. Aproveitei dessa chance para correr, do jeito que podia, de volta para casa e trancar a porta. Meu pai me olhava surpreso e preocupado. Meus irmãos, no sofá, se encolhiam de medo. Manquei até chegar na poltrona, onde desabei, aos sons de aterrorizantes dos galhos quebrando do lado de fora da casa.
- Maddy, o que aconteceu? – perguntou, preocupado, papai.
- Eu os vi, pai! – gritei, desespera. Ainda conseguia ouvir o som de maneira e folhas de árvore do lado de fora.
- O que você viu, Maddy?
- São lobos, pai! Lobos!
Capítulo IV - Lobos
Eu estava na casa de um amigo de meu pai que morava a algumas quadras depois da nossa casa. Decidimos sair de casa às pressas assim que o barulho do bosque cessou. Pegamos algumas roupas e as colocamos de qualquer jeito em algumas malas e chamamos um táxi para sairmos dali. Naquela mesma noite, meu pai ligou para a polícia. Devia ser uma da manhã quando ele o fez. Eu havia me lembrado de trazer o notebook, mas não tinha Wi-fi naquela casa.
- Está tudo bem, Amanda? – Perguntou-me Carl, o amigo de meu pai. – Sua perna está doendo?
- Não, eu estou bem. – Respondi breve.
- Estou fazendo chocolate quente, quer um pouco?
- Eu não quero incomodar. – Respondi, um pouco constrangida.
- Que nada, eu faço com o maior prazer.
- Então, obrigada. – Sorri tímida. Ele sorriu de volta antes de se virar para ir à cozinha. – Espere. – Chamei-o de volta.
Ele olhou em minha direção, virando-se para mim. Apontei a para a manga de sua camisa, seu braço estava sangrando.
- Está sangrando... – Preocupei-me.
- Ora, isso? Não é nada, é só um pequeno corte. Acidente de cozinha. – Mesmo assim, parecia ter mais sangue que o normal. Logo ele voltou para a cozinha fazer chocolate quente.
Eu e meus irmãos estávamos na sala de estar, e meu pai na sala de jantar. Eu conseguia ver através das portas de vidro que ele andava de um lado para o outro, impaciente. Estava ao celular, mas eu não sabia com quem era. Olhei ao redor, Richard começava a adormecer, mas Gabe parecia não querer ceder ao sono. Ele esperava pelo chocolate quente, ao mesmo tempo em que se mantinha alerta quanto a qualquer ameaça.
- Gabe, vem aqui. – Chamei-o. Coloquei o notebook na mesa de centro e descobri minhas pernas para que ele se deitasse.
Ele veio correndo até mim, fazendo com que Richard acordasse e viesse se deitar também. O sofá era espaçoso, em formato de L e cabia nós três sem que precisássemos ficar totalmente espremidos. Cada um deitou-se ao meu lado e eu peguei o notebook novamente. Passou-se algum tempinho até que Carl apareceu na sala com uma bandeja cheia de copos de chocolate quente e vestindo uma blusa limpa.
- O chocolate está pronto. – mal falou Carl e os meninos pegaram seus chocolates. Eu peguei o um dos quatro copos que sobraram e alguns biscoitos que ele trazia junto.
- Obrigada. – Agradeci.
- Não há de quê. – Respondeu, sorrindo. – Eu voltarei já, já. – Ele subiu às escadas para o andar superior.
Agora estávamos nós três novamente sozinhos. Ajeitei-me no sofá e comecei a mexer no computador. Algum tempo depois, Carl desceu acompanhado de seu único filho, Drew. Não nos dávamos bem. Ele era um ano mais velho que eu e sempre andava com a Candace. Possuía cabelos vermelhos, diferente dos de Carl que eram pretos e olhos negros intensos. Era mais alto que eu e forte também. Ele se sentou em uma das cadeiras e pegou um chocolate quente também. Carl pegou outro copo de chocolate e só restou um o de meu pai.
Ficamos em um silencio constrangedor. Somente Gabe e Richard brincavam enquanto tomavam chocolate, quase caindo de sono. Um som de alerta saiu do meu computador avisando que uma nova mensagem havia chegado. Eu havia me esquecido completamente que havia mandado uma mensagem às meninas. Ajeitei-me no sofá, sentando-me no mesmo e abri a mensagem. Era de Gregory, o que me surpreendeu bastante – já que não havíamos trocado e-mails.
Greg Hanson diz:
- Oi, é o Greg. Como você está? Pedi à Angela que me passasse seu e-mail. Ela me contou o que houve. Vocês saíram de casa?
Sammyland diz:
- Oi, Gregory. Eu estou bem e minha família também. Eu havia esquecido de pedir seu e-mail. Então você já soube, não é? Estou na casa de um amigo do meu pai. Papai está ligando para a polícia, para ver o porquê de aquele animal estar aqui.
Greg Hanson diz:
- Que bom. Acho melhor você ficar por aí mesmo, deve ser perigoso voltar para casa agora.
- Você tem tudo o que precisa? Eu posso ajudar com alguma coisa?
Sammyland diz:
- Sim, com isso eu concordo. Por um lado foi bom eu ter ido ao quintal observar o bosque.
- E eu não preciso de nada por enquanto, obrigada por se preocupar.
Greg Hanson diz:
- Eu não acho que a polícia vá conseguir pegar esse animal. Você o viu?
Sammyland diz:
- Sim, é um lobo, um lobo muito grande. Ele tem pêlo preto e os olhos também. Eu quase não conseguia distinguir sua silhueta da escuridão da noite.
Demorou bastante tempo para que ele resolvesse responder à minha mensagem. Eu comparei o tempo da última mensagem com o relógio no tempo atual, foram trinta e seis minutos de espera. Talvez ele estivesse fazendo algo importante.
Greg Hanson diz:
- Estranho... Mas o importante é que vocês estejam bem agora.
- Sammyland diz:
- É... =/
Greg Hanson diz:
- Eu vou ter que sair agora. Boa sorte. Até.
Sammyland diz:
- Obrigada. Até.
Antes que a minha mensagem fosse entregue, ele já havia saído. Decidi então fechar o notebook e terminar o meu lanche, meu apareceu na sala e pouco tempo depois de terminarmos nossos lanches, uma viatura parou em frente à casa de Carl e bateu na porta.
- Eu atendo. – Disse Carl rapidamente, meu pai o acompanhou e Gabe e Richard já haviam cedido ao sono.
O silêncio se instalou naquele lugar. Ao longe, eu e Drew podíamos ouvir as vozes de Carl, meu pai e os policiais.
- Você deve tê-lo visto bem de perto. – Começou Drew. – Meu pai me contou.
- Perto até demais. – Ajeitei-me entre os gêmeos, acomodando melhor minha perna no braço do sofá. – Ele avançou em mim, por sorte o ataque dele não me atingiu.
- Sorte mesmo. – Ele voltou a bebericar do chocolate quente. Eu tive a leve impressão de que ele não estava nada contente por eu estar bem.
Depois dessa curta conversa, ele se retirou aos seus aposentos. Eu me via, tecnicamente, sozinha naquele momento com meus próprios pensamentos. Eu ainda tentava processar o que havia acontecido naquele dia, mas não tive tanto tempo para isso. Logo, os policiais entraram na sala e se sentaram nos lugares vagos. Carl e papai pegaram os meninos no colo levando-os ao andar de cima.
- Sou a policial Nette. Já deve saber por que estamos aqui, não é? – Perguntou-me a policial.
- Por causa do animal que eu vi.
- Sim. – Disse o outro. Li seu nome no distintivo, era Cotton. – Queríamos que o descrevesse para nós, para tentarmos encontrá-lo...
Mordi os lábios. Por um motivo que desconhecia, algo me dizia para não entregar aquela informação a eles, um mau pressentimento. Resolvi ignorá-lo. Respirei fundo, agarrando com as duas mãos o copo vazio de chocolate.
- Amanda? – Era a voz de meu pai. Eu nem havia percebido que ele havia voltado para a sala junto de Carl. Ele me incentivava a contar o que vi.
- Era um lobo muito grande, quase do tamanho de um urso. – comecei. – Ele tinha o pêlo preto e desgrenhado, os olhos eram da mesma cor. Os caninos eram grandes e finos, assustadores...
- Era o mesmo animal que você viu há duas semanas. – Perguntou a policial Nette. – Quando você foi para a escola?
- Acho que sim, não tenho certeza. – confessei. – Acho que havia mais de um aquele dia.
O outro policial fazia alguma anotação ou um desenho num caderno. Raramente ele olhava em minha direção.
- Esse lobo tinha alguma característica em particular? Uma marca mais clara, uma cicatriz?
- Não, ele não tinha. Era todo preto.
- Mas, Maddy, você o viu dentro do bosque. – Falou Carl – Pode ser que você não tenha conseguido vê-lo direito. Estava escuro, não estava?
- Eu tenho certeza. – Falei, confiante.
- Bom, então, acho que isso é o suficiente, já que só temos essas informações. – Disse o policial Cotton. – Avisaremos à guarda florestal para verificar esse problema. Poderíamos conversar em particular, senhor Portland?
- Claro, por aqui. – Conduziu-os até a sala de jantar.
- Fique tranquila, Amanda. – Disse-me Carl. – Vai ficar tudo bem, vão pegar aquele animal.
- Espero que sim. – Disse não tão confiante.
Depois de uma conversa longa, os policiais foram embora. Dormi no quarto de Drew junto com meu pai – Drew e o pai dividiram o mesmo quarto – e os meninos dormiram no quarto de hóspedes.
No dia seguinte, com um dinheiro emprestado, alugamos um quarto de hotel para passarmos os próximos dias. Eu esperava que a guarda florestal encontrasse aquele lobo, mas eu tinha certeza que não conseguiriam capturá-lo. Ele parecia maligno, medonho, e não parecia temer a aproximação de um humano que poderia matá-lo. Se pudesse, é claro. De qualquer maneira, eu me sentia culpada por dar a descrição daquele animal aos policiais.
Vaguei pelo hotel. Não era um cinco estrelas, na verdade, mal chegava a três, mas era o único que podíamos pagar com o dinheiro que o governo nos emprestava. Era longe de casa e da escola, mas havia um armarinho do outro lado da rua e um supermercado à duas quadras, além de uma playhouse ao lado do hotel. Muitas pessoas preferiam morar ali, um lugar movimentado e cheio de comércios por perto. A única parte que incomodava era a música alta que saía de uma boate vizinha ao posto de gasolina.
Sentei perto de um banco na entrada do hotel, observando as pessoas – incluindo meus irmãos – brincarem dentro da enorme piscina comunitária. Quase não havia percebido quando Jennifer, Angela e Sabrina passaram pela recepção à minha procura.
- Aqui! – Gritei. Elas me ouviram e vieram na minha direção.
- Maddy! – Abraçou-me Angela. Fazia dois ou três dias que eu não as via, ainda mais depois do que havia acontecido. – Como você está, garota?
- Eu estou bem, graças a Deus. – Acalmei-a – Felizmente, não me machuquei.
- Você só atrai coisas ruins! – Falou Jennifer, como se me desse uma bronca.
- Mas ter boas amigas nesse momento compensa, não acha? – sorri de lado.
- Sua fofa! – Disse Lety, fazendo um biquinho. – Mas, enfim, explica melhor o que aconteceu para a gente.
Falei tudo com muita boa vontade tudo o que havia acontecido, com todos os mínimos detalhes. Quando conheci Susan no mercado, o lobo, o bosque, a noite que passei na casa de Drew, os policiais, a conversa por e-mail com Gregory. Contei tudo. Eu me sentia bem melhor depois de desabafar com minhas melhores amigas. Minha cabeça estava prestes a explodir e era muita coisa para processar.
- Nossa... – Disse Jennifer, quase não acreditando. – Por quanta coisa você passou.
- É... – Concordei. Olhei para a tala no meu pé.
- Mas vai ficar tudo bem, vão capturar aquele bicho. Tenho certeza. – Angela tentou me reconfortar.
- É, eles vão. – Sorri forçadamente. Eu tinha certeza de que não o pegariam, mas eu queria demonstrar às minhas amigas que eu estava confiante.
Eu tinha um mau pressentimento de que tudo iria piorar, se ainda era possível. Continuamos a conversar sobre outros assuntos, a escola era um deles. Elas me contavam sobre os micos que Candace pagara na aula de ginástica, sobre Alan, – o primo de Gregory que eu nunca memorizo o nome – os professores malas, as provas e, principalmente, sobre o Gregory e os recados que ele pedia às meninas para entregar para mim.
Quando o relógio soou seis da tarde, o horário das visitas haviam acabado. Despedi-me de minhas amigas e fiquei algum tempo por ali, observando as pessoas saírem da piscina pela ordem do gerente do hotel. Assim que todos saíram e pegaram seus pertences, o gerente pediu para que eu entrasse, pois logo fecharia as portas que davam para a piscina.
Subi as escadas e topei com meu pai e meus irmãos. Eles estavam arrumados e pareciam que iam à algum lugar muito frio.
- Maddy, querida. – Chamou-me papai. – Eu e os meninos iremos ao cinema. Quer ir conosco?
- Claro. Já vou me arrumar. – Falei, indo para o meu quarto.
Tomei um banho rápido de cinco minutos. Logo, troquei de roupa e pus uma camiseta branca com uma jardineira jeans. Nos pés, somente uma sapatilha preta. Prendi os cabelos em uma trança embutida e peguei um casaco, saindo do quarto.
- Vamos? – Perguntei retoricamente.
Logo estávamos em frente à bilheteria. Eu não me sentia muito bem, sentia como se estivesse sendo observada. À todo o momento eu olhava à minha volta, à procura de algum olhar sobre mim. Nada, só um cachorro de rua olhando na minha direção. Pensei seriamente que isto fosse paranóia minha causada pelos acontecimentos recentes.
O filme durou apenas uma hora e dez minutos. Para mim, havia acabado rápido, eu não prestava atenção. Novamente, quando saímos do cinema, a sensação havia voltado. O mesmo cachorro continuava no mesmo lugar, olhando na minha direção. Sentia como se uma aura sombria rondasse-o, tornando assustador.
- Está tudo bem, Amanda? – Meu pai olhou na mesma direção que eu olhava e fitou o cachorro. – O que foi?
- Nada. – Dei de ombros. – Vamos pra casa?
Voltamos para o hotel, o saguão de entrada estava cheio. Parecia que os hospedes queriam fazer uma festa, mesmo que o gerente fosse contra. Subimos, ignorando a barulheira que as pessoas faziam e entrando no elevador, indo para o nosso quarto. Não era bem um quarto, na verdade, era como uma casa simples. Tinha um cozinha americana conjunta com a sala, um banheiro e duas suítes. Meu pai dormia na sala e eu e meus irmãos dormíamos cada um em um quarto diferente.
- Vou tomar um banho, não saiam do quarto, entenderam? – Disse papai, mais para os gêmeos do que para mim.
Decidi fazer o mesmo, usando o banheiro que havia no meu quarto. Poucos minutos depois, coloquei um moletom e um shorts de pano para poder dormir confortável. Prendi os cabelos em um coque frouxo e liguei a TV e o ar-condicionado. Entrei embaixo do cobertor, assistindo um filme qualquer de ação.
Ouvi alguns uivos, minutos depois, vindo de fora da janela. Curiosa, fui ver do que se tratava. Novamente, vi lobos. Eram dois grandes e de pelo escuro – não necessariamente preto – e estavam parados no meio do asfalto. Como ninguém conseguia vê-los. Eu sei que deveria estar com medo, assustada, e devia chamar alguém, como uma pessoa normal faria, mas eu não conseguia. Eu não estava com medo, o que foi uma surpresa para mim. Eu estava curiosa, queria vê-los de perto.
Acho que eu devo ter enlouquecido. Sim, talvez deva ter sido isso. Calcei as sapatilhas e saí do quarto na ponta dos pés. Meu pai estava dormindo no sofá, e meus irmãos pareciam estar vendo algo impróprio para suas idades na TV à cabo. Saí de lá, descendo as escadas que davam para o saguão de entrada e saindo despercebida em meio às pessoas que ainda estavam lá, agora, fazendo uma festa animada na piscina.
Lá estavam eles, no meio do asfalto. Eles começaram a se mover para uma rua mais deserta, eu os segui.
- Aqui está bom. Acabe com isso antes que alguém nos veja. – Uma voz masculina surgiu das sombras de um beco.
Os dois lobos levantaram-se nas patas traseiras. O corpo agora era uma mistura escrota de um corpo humano coberto de pelos de animal, as patas tornaram-se mãos com longas unhas que pareciam poder cortar com facilidade uma placa de aço. Parecia um Deja Vú. Novamente, eu estava na frente de um animal anormal que estava prestes a me matar. Eu estava com medo e não conseguia me mover.
Outra vez, a sensação de quase morte passou por mim e, outra vez, o ataque dos dois lobos falhou. Saindo das sombras, mais dois lobos – um de pelo branco e outro de pelo caramelo – mostraram-se e investiram contra os que vinham me atacar.
- Christopher! – Eu reconhecia aquela voz. – Deixe-a em paz, o seu problema é comigo!
Rapidamente, virei na direção daquela voz. Era Gregory, acompanhado de mais um lobo, com um pelo em cor castanho.
- Gregory! – Gritei. Eu estava paralisada de medo, nem ao menos conseguia dizer seu nome sem gaguejar.
- Agora não tem como, o culpado disto foi você, sabia? – O dono da outra voz surgiu das sombras.
O mesmo parecia ser um estrangeiro, um italiano. Tinha longos cabelos castanho escuro, alto e forte. A pele era tão clara que podia ser visto com facilidade o sangue correr por debaixo dela, além de ter olhos vermelhos como sangue e um sorriso maléfico nos lábios finos.
- Eu sei, mas você não pode matá-la, isso vai contra as regras. – Gregory retrucou, aproximando. O lobo ao seu lado mantinha-se perto dele.
- Não, não... Você não entendeu, Vinícius. – Christopher disse, pronunciando o nome errado de Gregory. – Eu posso matá-la, posso matar quem eu quiser. Você não pode. – Sorriu maléfico.
- Você não ousaria... – Gregory pareceu ameaçá-lo.
- Tente me impedir se for capaz. – Voltou a sorrir, agora na minha direção. O mesmo se aproximava ameaçadoramente.
A cada passo que dava, as roupas se rasgavam; sua altura aumentava rapidamente; assim como os pelos escuros cresciam e o rosto tomava uma forma mais canina. Suas mãos tinham garras e um calda podia ser vista por trás das pernas.
- Não! – Supliquei. Ele estava pronto para me matar, mas antes que suas garras pudessem me atravessar, um quarto lobo de pêlo castanho escuro o atacou.
Eu estava no meio de um campo de batalha, eram seis lobos de tamanho e força descomunal brigando entre si. Eu procurava Gregory com o olhar, mas ele havia desaparecido. Somente mais um lobo de pêlo caramelo veio em minha direção, mordendo a manga do meu moletom em um pedido para que eu o montasse em suas costas, o que fiz sem demora.
Corremos para bem longe, de volta para o bosque que eu conhecia muito bem. Saltei de suas costas, apoiando-me em uma árvore qualquer. O lobo transformou-se em um homem... Ele estava de costas, mas eu sabia muito bem quem era.
- Gregory?
Capítulo V - Os Gêmeos
Eu estava nervosa, um pouco assustada, com bastante raiva. Por um momento eu pensei seriamente se eu era normal, mas não cheguei a uma boa conclusão. Talvez quando eu estivesse com a vida por um fio e, sei lá, um lobisomem resolvesse arrancar minhas tripas junto com o meu coração, eu poderia pensar com clareza. Ai eu percebi o quão louca eu era, afinal, lobisomens não existem, não é? Quem sabe eu inventei uma história maluca para sair do tédio e entrei – literalmente falando – dentro dele? E eu estaria internada em um hospício totalmente drogada enquanto imaginava lobos de tamanho anormal atrás de mim?
Agora que eu descobri isso, talvez eles me deixassem voltar para casa. E eu esqueceria esse tal de Gregory. Mas as coisas não pareciam ter sido acontecimentos que podem ser inventados do nada.
Depois de um longo tempo, a história sem sentido começava a fazer sentido. Olhei ao redor, ali estavam Alan, Gregory, Susan, e, por mais inacreditável que pareça, Drew e Carl. Todos, exceto Gregory, tinham alguns ferimentos que poderiam ser considerados graves, mas eles não pareciam estar preocupados com isso. Pareciam estar preocupados comigo, ou preocupados pelo fato de eu saber o que eles eram.
Até aquele momento, ninguém havia tentado se explicar, sequer haviam dito uma palavra.
- A culpa é sua! – Começou Drew. Por um momento, pensei que estivesse me acusando, mas ao se aproximar mais, percebi que falava com Gregory.
- Eu sei. – Gregory falou, mantendo sua postura séria.
- É a única coisa que você diz!? “Eu sei”!? – Gritou Drew. Todos mudaram de postura, como se fossem voltar a brigar.
- É, é sim! Eu sei que a culpa foi minha, mas não foi minha intenção envolver todos nisso! – Retrucou Gregory. – O que mais você quer que eu diga? “Desculpe-me”? Até parece que iria aceitar!
- Não, eu não ia. A minha vontade é de matar você! – Drew voltou ao mesmo lugar onde estava antes. – Sabe há quanto tempo nós nos escondemos aqui? Há vinte anos!
- Drew, se acalme. – Pediu Carl.
- Não, eu não vou! A culpa é sua também!. – Drew naquele momento parecia mais intimidante. – Você não devia ter salvado a Amanda no bosque. Ela viu o Miguel transformado!
Agora fazia sentido, o bosque, o lobo, o ataque que havia falhado, o som de madeiras de partindo. Quem impediu aquele lobo de me matar foi Carl, ele lutou com o lobo, por isso aquela ferida no braço.
- Eu não ia deixar que ela morresse, Drew, você também não deveria deixar, você sabe o por que. – Disse Carl. Ele olhou para mim, um olhar afetivo.
- Ela é uma Mestiça. Por que eu me sacrificaria por isso?
- Uma Mestiça? Viva? – Alan pareceu curioso.
- Ela é sua? – Perguntou Susan para Carl.
- Não, ela não é. – Respondeu Drew por ele.
- Isso muda totalmente os planos. – Alan falou. Eu me perguntava se havia um plano. – Se dissermos à guarda licantrópica que Amanda é uma Mestiça, talvez eles não tentem matá-la. Ela nunca quebrou uma regra, pode viver sua vida normalmente e a gente arranja um jeito de fugir.
- Eles não vão acreditar. – Falou Gregory puxando meu braço por cima de seu pescoço, em um pedido mudo que eu montasse em suas costas. – Nunca uma Mestiça sobreviveu ao primeiro dia de nascimento, quem dirá a quase dezesseis anos.
- Ele tem razão. No momento, vamos nos concentrar apenas em protegê-la. – Falou Carl. – Faremos a guarda no hotel.
- Certo. – Respondeu Susan.
Todos se preparavam para ir embora, mas Gregory e Drew não haviam se mexido. Eles se olhavam fixamente. Eu tentava entender o que se passava ali, antes de Drew correr floresta adentro em uma velocidade sobre-humana. Gregory não disse nada na corrida de volta ao hotel. Ele escalou com facilidade a parede do prédio sem auxilio algum, e me deixou dentro do meu quarto.
- Fique tranquila, a gente vai estar por perto. – Disse Gregory, ameaçando ir embora.
- O que é uma Mestiça? – Perguntei. Eu estava incrivelmente corada, e não sabia qual o motivo.
- Não é nada. – Ameaçou ir embora novamente.
- Então eu sou um nada? – Perguntei, olhando para o chão.
O ouvi respirar fundo, sentando-se na minha cama.
- Quanto menos você souber, melhor. – Segurei seu braço para que ele olhasse para mim.
- Eu quero saber! – Disse confiante, o que me assustou por um momento. – O que eu sou?
- Amanda? – A voz do meu pai cheia de sono me chamou. – Com quem está falando?
- É a televisão. – A televisão já estava ligada, então aumentei um pouco o volume.
- Melhor ir dormir, já está tarde. – Disse papai.
- Está bem. – Diminui o volume da TV. Papai não disse mais nada, então cheguei à conclusão de que ele havia voltado a dormir.
Levantei da cama e tranquei a porta do meu quarto.
- Não posso te dar detalhes e não posso te dizer o significado de uma Mestiça para nós. – Gregory começou. – É melhor que você não saiba, já estamos pondo sua vida em perigo, não queremos pôr a vida da sua família em risco também.
- Vocês não podem agir como se eu não estivesse aqui! – Eu estava completamente confusa. – Eu estou achando até que estou começando a ficar louca!
- Quem dera fosse isso. – Gregory ironizou.
- Eu não direi a ninguém, eu juro! – Implorei. – Por favor!
Porém, ele havia me dado algo que eu não me lembrava de ter pedido. Eu senti seus lábios sobre os meus, seus braços me puxando para perto dele, enrugando os lençóis na cama. Fechei meus olhos, curtindo aquela sensação. Sentei sobre meus joelhos e enrosquei meus braços sobre o pescoço dele.
- Se eu te contar, eu vou ter que te matar. – Disse Gregory. Ele apoiou sua testa na minha. Olhei para o seu rosto, mas seus olhos estavam fechados. – Não me obrigue a fazer isso.
- Desculpe. – Pedi sincera – Eu não perguntarei novamente.
- Se eu não tivesse... – Ele parecia estar em um conflito interno. Parecia estar sofrendo. Eu me senti abatida, arrasada. – Esqueça.
Ele voltou para a janela, sentou-se nela e pôs os pés para fora, pronto para pular e ir embora.
- Você vai voltar amanhã? – perguntei, esperançosa.
Suas bochechas ergueram-se em um sorriso. Olhou em minha direção enquanto colocava o resto do corpo para fora da janela.
- Não prometo nada. – Falou antes de pular a janela e desaparecer na escuridão da noite.
Ele não havia voltado no dia seguinte, mas eu sabia que ele estava por perto. Que todos estavam.
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Passou-se quase duas semana depois daquele dia. Eu já não precisava da tala no pé e minhas “férias” da escola haviam acabado. Como prometido, eu não havia contado à ninguém sobre o que presenciei, apesar de saber que ninguém acreditaria. De manhã eu ia para a escola, encontrava com minhas amigas, com Gregory e com Alan, infelizmente com Candace e Ashley, e de vez em quando, com Drew; à tarde eu voltava para o hotel e raramente saía para o cinema, ou para o café que tinha por perto; à noite, eu ficava no hotel vendo um filme até dormir.
Para mim, era uma tortura. Eu me sentia sendo vigiada a todo instante, e não era somente pelos olhos de Gregory e os outros, era pelos olhos de Christopher e seus companheiros também.
- Maddy, venha comigo. – Disse Gregory, pondo um de seus braços sobre o meu pescoço, guiando-me para perto de seu carro.
Olhei em volta, todos me observavam surpresos. Eles não escondiam os olhares curiosos sobre mim e isso me deixada bastante desconcertada. Eles cochichavam de boca aberta, incrédulos, pensando, imagino eu, em como consegui me aproximar de um garoto tão... Eu nem conseguia achar uma palavra ao certo para descrevê-lo.
Gregory, ao contrário de mim, não parecia se afetar com eles. Ele não disse nada, apenas encostou-se no carro e deixou que eu sentasse na capota do mesmo. Ele estava tenso, mesmo que não deixasse transparecer. Em pouco tempo, eu sabia como ele reagia a cada ação. Eu pensava seriamente se ele me deixava ver sua verdadeira personalidade, ou então se ele baixava, mesmo sem perceber, a sua guarda perto de mim.
- O que aconteceu? – Perguntei, preocupada.
- Eles estão aqui... – Respondeu, aproximando-se mais de mim, como se estivesse pronto para me defender a qualquer momento.
O som de dois motores atraiu minha atenção. Duas motos pretas da Yamaha estacionaram logo no lado do carro de Gregory, os dois usando a mesma vaga. Os dois motoqueiros desceram da moto e tiraram os capacetes. Eram gêmeos idênticos, somente a cor dos cabelos – um com cabelos azuis e outro com cabelos negros – distinguia os dois. Possuíam olhos azuis e cabelos curtos e picotados. Eram altos e fortes, mas não tanto quanto Gregory. Ambos me lembravam de mais o Alan na aparência.
Eu conseguia diferenciá-los apenas pelo cabelo e pelo blazer da escola, com o brasão de um globo enfeitado, que apenas um deles usava. O outro estava com o colete da escola, com o mesmo brasão. Ambas as camisas eram brancas e de mangas compridas.
- Vinícius... – Começou um deles, como se o conhecesse há muito tempo.
- Gregory. – Corrigiu-o Gregory, curto e grosso.
- Claro, claro. Nova vida, novo nome. – Deu de ombros.
- O que fazem aqui? – Gregory cruzou os braços sobre o peito, mais sério que o normal.
- Nós? – Perguntou o outro, retórica e ironicamente. – O mesmo que você e sua família: Camuflando-nos entre os humanos... – Ele olhou para mim perversamente. Senti-me estremecer. – Para alcançarmos nossos objetivos.
- Não vão chegar à lugar algum assim. Não podem fazer nada contra nós em público. – Disse Gregory, dando um passo à frente.
- Tem certeza? – O primeiro desafiou-o.
Olhei em volta, extremamente nervosa. Todos continuavam a cochichar, a maioria eu conseguia escutar por causa do volume de voz que usavam. Pareciam que queriam que eu ouvisse, ou se não, a minha audição estava mais aprimorada do que nunca. “... Acho que aqueles dois conhecem o novato de algum lugar.”, disse alguém. “... Eles não parecem estar tendo uma boa conversa. Será que vão brigar?”, disse outro. “... Eu não acredito que o novato fala com a Amanda. Ela é tão esquisita!”, disse uma das adoradoras de Candace. Aquilo me incomodava demais. Mesmo que aquelas pessoas não soubessem que aquele assunto me envolvia de uma maneira inexplicável.
- Absoluta. – Gregory respondeu-o confiante.
Os gêmeos sorriram de lado, colocando as mochilas no ombro esquerdo ao mesmo tempo. Parecia que seus movimentos eram sincronizados, mas sem tentar fazê-lo de propósito.
- Sua fé é tão forte... É uma pena que acredite em algo que não exista em nossa sociedade, Viní... Gregory. – Corrigiu-se o segundo gêmeo. Por um momento, acreditei que os dois deixaram transparecer um sentimento incomum. Identifiquei-o como compaixão, achando que talvez estivesse realmente enlouquecida.
- Bom, os veremos no horário de almoço, Gregory. – Disse o primeiro. – Esperamos vê-la também, senhorita Portland. – Arrepiei-me ao ouvir meu sobrenome ser pronunciado de maneira tão perversa.
Os dois começaram a caminhar em direção ao prédio 2, acompanhados pelos olhares dos curiosos. Nem ao menos haviam esperado uma resposta de Gregory ou minha. Assim que desapareceram de vista, comecei a pensar na conversa “amigável” que os dois haviam tido com Gregory e sobre a relação deles com o que havia acontecido desde a primeira aparição dos lobos para mim.
- Qual deles é o Miguel? – Perguntei. A respiração de Gregory falhou, revelando sua surpresa ao constatar que eu havia adivinhado tão rápido a ligação deles comigo, ou talvez por eu saber que havia um Miguel.
- É o de colete. – Respondeu, sentando-se ao meu lado no capô de seu carro. – O outro, antes que pergunte, se chama Pierre. São gêmeos, como pode ver. Franceses, mais experientes que eu, além de mais velhos. Pelo menos, minha força é maior que a deles.
- Quantos anos eles tem? – Perguntei por perguntar. Não estava curiosa sobre suas idades, sequer sobre eles. Eu estava preocupada com o meu pescoço.
- Tem quase vinte em anos humanos. Na idade de lobo, eles tem oitenta e três.
- E você, na idade humana?
- Acho que acabei de fazer dezessete anos. – Sorriu de lado.
O sinal soou alto e potente. Imaginei o diretor gritando no interfone, na época em que o sinal havia quebrado, mandando todos irem para as salas de aulas. Ri internamente lembrando-me daquele fato. Saltei de cima do capô, colocando a mochila no ombro direito.
- Nos vemos no almoço. – Disse-me Gregory. – Fique ao lado das suas amigas, sempre. Eles não chegarão perto de você se estiver acompanhada.
- Tudo bem. – Sorri amarelo. – Até, então.
Gregory não respondeu. Apenas pegou seu material dentro do carro e me acompanhou até o primeiro prédio, onde os alunos de primeiro ano recebiam suas aulas. Separamo-nos ao chegar a nossas respectivas salas. Sentei-me ao lado de Jennifer na aula de Biologia 2.
- Devo perguntar quem eram aqueles dois novatos? – Começou uma Jennifer curiosa.
- Acho que não. – Sorri de lado, desejando que acabássemos aquele assunto.
- Por quê? – Insistiu.
- Depois eu te falo. – Encerrei por ali.
Depois disso, ficamos em silêncio. Jennifer se mostrava mais do que curiosa sobre os gêmeos, e mesmo que eu quisesse falar sobre eles, eu não podia. Eu repassava e repassava na minha mente tudo o que havia acontecido no último mês. Era loucura, mas era real e eu não havia achado uma maneira de me livrar daquele pesadelo. Logo a aula de Biologia havia acabado e então trocamos de sala e assistimos a dois tempos de Sociologia 1, uma das aulas mais interessantes daquele ano.
- Vou chamar a Angela e a Sabrina, pega o meu almoço. – Jennifer me deu o seu dinheiro, andando rapidamente até o outro lado da cantina, onde estavam Sabrina e Angela. Era raro Jennifer se mostrar tão curiosa por uma fofoca.
- Certo. – Falei. Logo que ela saiu, Drew pegou uma bandeja e entrou na fila atrás de mim. – Drew?
- Gregory me avisou. – Disse-me breve e curto. – Não se afaste das outras pessoas e nem vá para casa de transporte.
- E como eu vou voltar para casa? – Perguntei um pouco aflita. Peguei as coisas que Jennifer gostava de comer e coloquei na sua bandeja, logo colocando algumas coisas que eu gostava na minha, pagando as duas.
- No carro do Gregory. – Ele pegou alguns pratos na mesa e pagou à merendeira.
Suspirei fundo. A última vez que estive no carro de Gregory, eu quase sofri um ataque cardíaco. Ele dirigia feito louco, em uma velocidade que um carro normal não atingiria com facilidade. Eu sabia que ele era um bom motorista, mas eu tinha amor à minha vida.
- Certo, então. – Peguei as bandejas e sentei-me à mesa onde costumava sentar sempre com Sabrina, Angela e Jennifer. As três já estavam me esperando, enquanto falavam de alguma coisa.
Novamente, parecia que eu estava com a audição mais aprimorada do que normalmente estaria. Parecia que todos naquela cantina só sabiam falar dos gêmeos. “... Eles são alunos de intercâmbio, vieram da França. Soube que o tutor deles é italiano, mas mora na França com a mãe deles.”, disse alguém. “... Fala sério! A Amanda é tão sortuda! Os novatos só falam com ela. Até o Drew Carl do 3º ano!” , era a voz de Beatrice Johnson, que todos normalmente chamavam de Bia, do clube do livro que eu participava. “... Eles estão no segundo ano. Será que não vão ficar por muito tempo? O ano letivo está prestes a acabar.”, disse mais um. “... Tomara que sejam solteiros! Se não deu com o Alan, tem que dar certo com um deles. Nem me importo de saber quem é quem.”, reconheci imediatamente a voz de Angela, seguindo logo de uma gargalhada espalhafatosa. Todos pareciam estar interessados nos gêmeos, ou em mim, pois não paravam de me olhar.
Sentei-me à mesa, colocando as bandejas na mesa. Elas pareciam analisar cada movimento meu.
- Maddy. – Chamou-me Angela. – Conte tudo!
Capítulo VI - Verdades
- Contar o que? – Fiz-me de desentendida. Levei à boca uma colherada de purê de batata.
- Todo mundo está comentando, Maddy! – Falou Angela, animada. – Sobre o novato, Gregory e você. E também sobre os outros alunos novatos, que chegaram hoje. Quem são eles?
- Eu não os conheço, eles falaram apenas com o Gregory. – Disse breve. Eu calculava bem minhas palavras para evitar passar uma informação muito importante.
- Sério? – Quis confirmar a Sabrina. Ela desconfiava que eu estivesse mentindo. – De verdade?
- De verdade! – Confirmei.
- Mas e quanto ao Gregory? – Perguntou Angela curiosa. – Ele fala de você o tempo todo, sempre que vem até a gente é para perguntar sobre você. – Eu estranhei aquilo. Gregory me via todos os dias, a todo minuto estava ao me observando, mesmo que não estivesse próximo a mim.
- Entre a gente não tem nada, é só amizade. – Instintivamente, coloquei uma mexa do meu cabelo atrás da orelha. Eu havia me condenado naquele momento, todas sabiam que quando eu fazia aquilo, eu estava tentando esconder alguma coisa.
- Amanda... Eu disse pra contar tudo! – Angela me deu uma bronca.
Confesso: Senti-me tentada a contar sobre o beijo que havíamos trocado, ocultando, é claro, as partes mais importantes. Pensei por um momento: “Como eu cuidei tanto pra não dizer nada sobre o Gregory, o Alan e o Drew serem lobisomens e que os gêmeos novatos de que elas tanto falavam queriam nos matar, mas me descuidei por causa do beijo?”. Já disse que eu não me achava uma pessoa normal?
As três me lançavam olhares intimidadores, a fim de fazer com que eu dissesse tudo. Eu não via outra escolha, se não dissesse, elas me torturariam até que abrisse o bico.
- Desembucha logo! – Sabrina exclamou ansiosa.
- O Gregory me beijou, só isso! – Voltei a comer o meu almoço, totalmente envergonhada.
- Você só pode estar mentindo. – Disse uma voz atrás de mim. Virei-me para ver quem era. Era a Li do 2º ano. – O Gregory?
- Nossa, Amanda, como você é sortuda! – Disse Charlotte do 2º ano, também. – Todas as meninas do primeiro e segundo ano estão tentando dar em cima dele, e você foi a primeira que conseguiu beijá-lo.
- Gente, olha só, não foi bem assim... – Tentei fingir que mentia. – Na verdade, não foi um beijo.
- Você mente muito mal! – Disse Sabrina. Minha vontade era de matá-la.
Eu estava totalmente envergonhada. Sem intenção, eu acabara mandando uma bela fofoca para todos. Elas não paravam de fazer perguntas do tipo: “Ele tem pegada?”, “Ele beija bem?”, “Vocês estão ficando?”. Aquilo estava me incomodando bastante, e eu queria sair o mais rápido dali.
- Com licença! – Levantei apressada, quase caindo no chão e corri para o banheiro feminino mais próximo.
Apoiei minhas mãos na bancada da pia, respirando fundo. Joguei bastante água no rosto antes de me olhar no espelho.
- O que é isso? – Meus olhos estavam vermelhos. Toda a íris estava em vermelho-sangue. – Ah, meu Deus!
Eu me analisava bem em frente o espelho, esperando que fosse só impressão minha, mas meus olhos não mudavam de cor. Ouvi vozes se aproximando, vozes que eu conhecia bem, então me escondi em um dos banheiros.
- A Amanda com certeza estava mentindo, o Gregory nunca a beijaria. – Era a voz de Candace. – Ela só quer aparecer.
- Mas pensa bem, é bem provável que seja verdade. – Era a voz de Ashley. – Ele sempre fica perto dela e de nenhuma garota. Até da gente, ele não gosta.
- Não, não! Ele não gosta de você! Ele só não teve tempo de me conhecer bem. – Disse Candace confiante.
- É, pode ser. – Ashley deu de ombros.
- Ai, que gloss lindo, Candace, me empresta? – Disse outra voz. Demorei um tempo até reconhecê-la como a de Melody.
Demorou bastante tempo até que as mesmas decidiram ir embora. Fiquei alguns minutos ali, antes de sair do banheiro. Olhei-me novamente no espelho, meus olhos voltaram aos verdes normais.
- Isso é bem estranho. – peguei minhas coisas e saí também.
As pessoas no corredor não paravam de me olhar. Muitas apontavam e cochichavam, davam risadinhas. Apressei os passos para o meu armário, onde peguei meu material de língua espanhola e física avançada.
- Maddy. – Chamou-me uma voz que eu conhecia bem.
- Gregory? – Ele se encostou em um dos armários próximos a mim. – Você já deve ter ouvido, né? – Fiz uma careta.
- Foi. – Sorriu de lado. – Os garotos ficaram me dando tapinhas nas costas desde o início do intervalo.
Ri timidamente. Coloquei uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, um pouco nervosa.
- Olha, não foi minha intenção espalhar isso por aí...
- Eu sei que não. – Interrompeu-me. – Você é o tipo de garota bem reservada, não diria algo que te fizesse o centro das atenções.
- Você reparou nisso? – Eu estava um pouco surpresa.
- Quem não repararia, é cego. – brincou.
- Espero que não se importe, acho que não dá pra consertar o estrago. – Disse sincera. Fechei o meu armário e o tranquei com o cadeado.
- Não, eu não me importo. – Sorriu para mim. Novamente, mais cochichos. Isso me irritava.
- Depois da aula, a gente pode conversar? É importante.
- Claro. – Concordou. Parecia que ele havia entendido a gravidade do assunto.
O sinal soou, avisando que o intervalo havia terminado. Todos voltaram para suas salas de aula. Eu e Gregory fomos para a aula de espanhol. A senhora Fernandes, uma mulher de quarenta e seis anos porto-riquenha que evitava ao máximo falar inglês, somente reclamava e soltava alguns palavrões em sala de aula. Era uma boa professora, mas ela esquecia de que palavrões em outros idiomas, todo mundo conhecia. Depois de dois tempos de puro tédio na aula de Física, finalmente nos livramos da escola.
- E o que era tão importante? – Perguntou Gregory, enquanto abria a porta do seu carro para mim.
- Acho melhor falar quando estivermos sozinhos. – Respondi.
Ele deu a volta no carro, entrando no lado do motorista. Pelo retrovisor, eu pude ver alguns alunos boquiabertos e uma Candace raivosa. Gregory ligou o carro e deu marcha ré e saiu do estacionamento em alta velocidade.
- Agora você pode falar? – Começou Gregory.
Suspirei.
- Acho que foi impressão minha, mas... Eu acho que meus olhos estavam vermelhos.
- Vermelhos como? – Ele olhou para mim.
- Pelo amor de Deus, olhe para frente! – Gritei desesperada.
Ele bufou, encostando em um posto de gasolina.
- Agora fale. – Gregory estava sério e intimidante. Por um momento, pensei que não seria saudável contrariá-lo.
- A íris dos meus olhos estavam vermelhas, um vermelho similar ao sangue. – Disse toda a verdade.
Ele parecia extremamente preocupado. Às vezes, olhava para fora do carro e para o volante. Estava pensativo e muito sério, nervoso e ansioso. Ele ligou o carro e foi para frente de uma das bombas de combustível. Saiu do carro, dando a volta no mesmo e colocando a mangueira para abastecê-lo. Ele pegou o celular e discou um número rapidamente, colocando-o no ouvido e começando a conversar com alguém.
Eu tentava ouvir o que ele falava, mas era impossível. Parecia que o som não atravessava o vidro, ou a minha audição estava limitada. O contador da bomba de combustível chegou a doze dólares e cinquenta e seis centavos quando ele resolveu colocar a mangueira no lugar. Ainda falando no celular, colocou algumas cédulas e moedas dentro de uma maquina e voltou para dentro do carro, desligando o celular.
- Com quem estava falando? – Perguntei curiosa.
- Com o Carl. – Ele respondeu breve. Parecia que ele não queria mais conversar, então evitei falar qualquer coisa que o aborrecesse.
Gregory dirigiu em alta velocidade para o hotel. Estava pronta para saltar do carro quando Gregory segurou meu braço.
- Não saia do hotel hoje. – Advertiu-me. Ele pegou uma caneta dentro da mochila e escreveu um número no meu pulso. – Me ligue se acontecer alguma coisa.
- Pode deixar. – Confirmei com a cabeça. Peguei minha mochila e saí do carro. – Tchau, Gregory.
O carro de Gregory deu partida e saiu em alta velocidade, virando em uma esquina qualquer. Entrei no hotel com milhões de pensamentos na cabeça.
- Boa tarde, senhorita Amanda. – Era Charli, o filho do gerente.
Charli tinha a minha idade. Era baixinho e muito branquinho. Quando eu me sentia um pouco chateada ou entediada, eu o chamava para conversa. Ele é bastante engraçado, tímido e gentil.
- Boa tarde, Charli. – Cumprimentei-o de volta.
- Aqui tem algumas cartas para o seu pai, poderia entregá-las a ele para mim, por favor? – Pediu educadamente.
- Claro, pode deixar. – Sorri para ele, pegando as cartas do balcão. – Tchau, Charli.
Voltei a andar em direção ao elevador quando Charli me chamou novamente.
- Ah, espere um pouquinho! – O olhei. Ele parecia bastante envergonhado e nervoso.
- Sim? – Perguntei.
- Eu queria saber se... Você queria... Sabe... Sair comigo um dia desses. – Ele parecia bastante nervoso e envergonhado.
Eu olhei meio espantada. Era a primeira vez que alguém me convidava para sair. Cocei o pescoço, um pouco nervosa. Eu não sabia que desculpa dar a ele.
- Desculpe-me, eu... – Procurei qualquer mentira na cabeça. – Eu tenho namorado.
- Ah, então... Esqueça o que eu disse. – Ele estava totalmente envergonhado e parecia bastante chateado.
- Desculpe, de verdade. – Entrei no elevador e apertei o botão do meu andar.
Em poucos minutos, eu já estava no meu quarto, me jogando na cama. Eu pensava na desculpa que havia dado ao Charli. Namorado... Automaticamente meus pensamentos se voltaram ao Gregory e no beijo. Eu não sabia se havia algum relacionamento tão forte entre nós que pudesse ser chamado de namoro. Fiquei pensando nisso durante algum tempo até que decidi fazer algo útil. Olhei para o celular, haviam quatorze mensagens não lidas. Duas delas era da operadora, as outras das minhas amigas. Eu não tinha a mínima vontade de ler, então coloquei o celular em algum canto qualquer.
Olhei em meu pulso, o celular de Gregory estava ali. Decidi anotá-lo em um papel para não correr o risco de perdê-lo e então peguei uma muda de roupa confortável e fui para o banheiro tomar um banho relaxante antes de ir tirar um cochilo.
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Acordei às seis e vinte e cinco da tarde ao som de uma voz masculina que chamava o meu nome. O céu estava escurecendo e grossas gotas de chuva molhavam a janela. Do lado de fora, somente os carros passavam e pessoas andavam apressadas, cobrindo-se da maneira que podiam. Uns com guarda-chuva, outros com capuz e mais alguns com um agasalho. Somente dois homens, do outro lado da rua, estavam parados em baixo do mesmo guarda-chuva.
Eu os reconheci de imediato. Eram o Miguel e o Pierre, os gêmeos que me atacaram alguns dias atrás. Procurei meu celular em cima da estante e o papel com o telefone de Gregory, discando-o rapidamente.
- Gregory. – Chamei-o, assim que ele atendeu.
- O que houve, Maddy? – Perguntou-me, preocupado.
- Eles estão aqui. – Olhei pela janela, eles pareciam estátuas. Estavam no mesmo lugar, olhando para cima, na minha direção. – Os gêmeos.
- Você está sozinha?
- Acho que não. – Olhei em direção à porta. – Espere um pouco.
Calcei os chinelos e abri a porta do quarto. Meu pai via televisão deitado no sofá e os meus irmãos brincavam de carrinho perto da mesa de jantar. Voltei para o quarto, fechando a porta devagar.
- Não, não estou. Papai e os meninos estão aqui.
- Não saia daí, eles não vão te fazer nada se estiver com outras pessoas.
- Gregory...
- O que foi?
- Não parece que eles querem me matar, pelo menos, não agora. – Olhei bem pela janela. Eu não me sentia tentada a sair de casa, como da outra vez. Desta vez, eu sentia que poderia recusar, mesmo que eu não quisesse.
- Amanda, faz o que eu estou mandando! – Advertiu-me.
- Eu vou ficar bem, eu juro.
- Amanda... Amanda! Caramba, que garota teimosa! – Desliguei o telefone.
Coloquei uma roupa de frio e peguei o guarda-chuva, saindo do quarto.
- Aonde você vai? – Perguntou-me papai.
- Vou na biblioteca, já volto. – Apressei o passo, saindo pela porta de entrada.
- Mas a biblioteca já fechou à essa hora! – Gritou papai. Apenas fingi que não havia escutado.
Logo, eu estava seguindo os gêmeos para o mesmo beco em que eles um dia tentaram me atacar.
- Senhorita Portland. – Reconheci Christopher. – Que prazer vê-la, pena que ainda viva.
- O que queriam falar comigo? – Fui direta e grossa.
- Sobre o seu querido Gregory, é claro. – Ele aproximou-se intimidadoramente. – Mesmo que não acredite, somos os mocinhos nessa história.
- Os mocinhos que tentam atacar as pessoas? – Ironizei. Eu sabia que estava brincando com fogo, mas eu não podia evitar, eu sentia nojo daquele homem.
- Não, não... Apenas fazemos com que as coisas fiquem em ordem na nossa sociedade. Uma sociedade diferente da sua.
- E o que Gregory fez para que a ordem na sua “sociedade” fosse perturbada?
- Quebrou uma das nossas regras mais importantes.
- E qual seria? – Perguntei, afrontando-o.
- Matar um humano.
Capítulo VII - Revelações
- Você está mentindo! – Acusei-o, porém Christopher parecia falar a verdade. – Gregory nunca mataria uma pessoa!
- Ora, não? – Desafiou-me, Christopher. – Pergunte para ele, tenho certeza que ele não mentirá para você.
- Você não me deixaria ir embora.
- Não, eu não deixaria. – Concordou. Christopher caminhou em torno de mim, analisando-me. – Mas a situação é outra. Queremos que saiba que, ao contrário do que pensa, o garoto que tanto protege é um assassino frio e cruel.
- O Gregory não é mal! – Gritei. – Ele nunca matou uma pessoa!
- Sim, ele matou. – Ele elevou o tom de voz. – Uma pessoa inocente, que não conseguiu se defender das garras de um lobisomem. E isso aconteceu num assalto a banco. Por causa dele, mais quinze pessoas morreram.
- Cale a boca! – Joguei o guarda-chuva aberto em sua direção, mas ele o desviou com a mão com bastante facilidade. – Você é nojento!
- Dobre sua língua, sua... – Um dos gêmeos começou a falar quando foi interrompido.
- Acalme-se, Pierre. – Disse Christopher. Pierre voltou ao seu lugar de cara fechada, ao lado de um Miguel inconformado. – Como eu disse, Senhorita Portland, pergunte ao Gregory. Ele não lhe negará nada, afinal, ele não pode.
Dei meia volta, preparando-me para sair daquele lugar. Naquele momento, eu estava em dúvida se acreditaria ou não na história de Christopher. Dei alguns passos à saída, mas parei antes de cruzar a linha da esquina com a calçada. Pensei bem, por que ele me contaria algo? Por que não me matar? Eu não havia encontrado uma boa resposta para isso.
- O que ganha me contando isso? – Perguntei. A rua estava deserta, somente alguns carros estacionados e alguns estabelecimentos quase vazios estavam abertos.
- Uma cúmplice, quem sabe. – Respondeu-me. Sua voz tinha um tom de malícia. Não insisti, sabia que não arrancaria mais nada dele.
- Nem mesmo nos seus sonhos mais sórdidos. – Disse, antes de virar a esquina e voltar para o hotel.
Certifiquei-me de que não estava sendo seguida, mesmo que não fosse necessário. Eles sabiam onde eu estava hospedada. Entrei no hotel sob reclamações do gerente sobre eu estar entrando no saguão toda molhada. Ignorei-o, pegando o elevador e indo até o meu lar provisório. Papai olhou-me da cabeça aos pés, exclamando algo como “Você está toda molhada!” e “Onde está o guarda-chuva que você estava levando?”. Apenas dei uma desculpa esfarrapada de que o perdi e fui para o meu quarto.
Peguei uma muda de roupa e fui para o banheiro tomar um banho. A água quente relaxava meu corpo. Eu repassava na minha mente todas as palavras de Christopher, toda a gravidade que aquelas palavras passavam. Uma pessoa inocente... Eu queria acreditar que Christopher mentia, mas eu estava em dúvida. E se ele estivesse realmente dizendo a verdade?
Terminei meu banho minutos depois, secando meu corpo e parcialmente os cabelos. Coloquei um shorts de pano preto e uma blusa amarela, saindo do banheiro e me jogando na cama deitando de lado. Não demorou muito tempo para que o som de pneus cantando na rua chamasse minha atenção. Eu não precisava olhar pela janela para saber que era Gregory. Mesmo assim, não me mexi, esperei que ele escalasse a parede do hotel e viesse me ver, o que não demorou mais do que um minuto.
- Você está bem? – Perguntou Gregory, abrindo a janela do quarto e saltando em cima da cama com as roupas encharcadas pela chuva. – Eles te fizeram algo?
- Não. – Respondi breve.
Eu não precisava olhar para ele para saber que estava preocupado. Eu não queria olhar para ele, do contrário, toda a minha coragem, que deveria ser mínima naquele momento, iria embora.
- Gregory. – O chamei. – Você realmente matou uma pessoa?
Senti que ele havia ficado tenso naquele momento. Ele se levantou da cama e caminhou até a porta, apoiando-se nela. Demorou um bom tempo até que ele decidiu olhar para mim, respirando fundo enquanto tentava relaxar seus músculos.
- O que ele te disse? – Perguntou. – O que o Christopher disse?
- O suficiente.
- Amanda, isso não é... – Eu o interrompi.
- RESPONDA! – Gritei. Eu já não me importava se meu pai, meus irmãos ou até os vizinhos escutassem. – Você matou uma pessoa?
A resposta veio certeira. Eu esperava que ele negasse, mas Christopher tinha razão: Gregory não mentiria, ele não queria mentir.
- Eu matei, – Ele respondeu sério. – mas eu não tinha escolha.
- Amanda? – Era meu pai. Eu o ignorei, não estava em condições de respondê-lo com todos os meus sentimentos me afetando. – Amanda, está tudo bem?
- Você matou uma pessoa, Gregory! – Respondi com a voz carregada de angustia. – Você matou pessoas!
Eu sentia meu nariz arder e minha cabeça latejar violentamente. Antes que eu pudesse tentar me acalmar, respirar fundo, as lágrimas de mágoa e decepção rolavam pelo meu rosto sem o meu consentimento.
- Amanda... – Chamou-me pelo nome enquanto se aproximava. Rolei na cama, ficando de costas para ele.
- Vá embora! – Pedi. Eu já não tentava mais parecer firme naquele momento. Eu queria que ele me deixasse sozinha, e ele pareceu entender que eu precisava de um tempo.
Senti o colchão afundar e vi Gregory apoiar-se no parapeito da janela. Para mim, era um mistério o que se passava na cabeça dele naquele momento. Fechei os olhos quando ele saltou. Finalmente eu consegui respirar normalmente e me deixei levar pela confusão de sentimentos que me deixavam inebriada.
- Amanda. – Chamou-me papai mais uma vez. – Eu vou entrar.
Ouvi o som da porta se abrir e depois se fechar. O colchão afundou novamente quando papai sentou-se nele, ao meu lado. Ele carinhosamente acariciou-me o braço direito, antes de me puxar para trás, fazendo-me deitar de barriga pra cima.
- O que aconteceu, filha? – Perguntou preocupado. Acariciou-me o rosto que já deveria estar vermelho e inchado. – Por que está chorando assim?
- Eu quero ir pra casa! – Confessei um dos meus maiores desejos. – Quero ir agora...
- Oh, Amanda... – Papai puxou-me para um abraço, o qual eu retribuí. Depois ele beijou minha testa. – Está com febre. – Ele deitou-me na cama, colocando a mão na minha testa e no meu pescoço para medir minha temperatura. – Espere aqui.
Ele fechou a janela antes de sair. Voltei à mesma posição em que estava antes, agarrando-me aos lençóis e cobertores. Eu olhava para a janela recém-fechada, imaginando ali o Gregory com seu sorriso encantador. Parte de mim desejava ir atrás dele e pedir para que ficasse, a outra dizia que isso era algo imprudente. Eu não sabia quais eram os meus sentimentos sobre o Gregory, mas eu sabia que ele conseguia confundir todos os meus pensamentos e emoções.
A chuva continuava forte do lado de fora, molhando o vidro da janela e fazendo uma melodia de ninar. Fechei os olhos mais uma vez, sentindo a dor de cabeça piorar, mas logo o sono foi me dominando sem que eu pudesse lutar contra ele.
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Sábado, no dia seguinte, eu havia faltado o último dia de aula antes do Spring Break. Um médico veio até o hotel me examinar, visto que a febre havia piorado tanto que eu não conseguia distinguir realidade de sonho, e sempre via coisas que não estavam ali. Depois de me receitar alguns remédios e repouso, ele se foi, alegando ter de cuidar de outro paciente. Papai parecia preocupado. Aparentemente, a causa da febre fora a chuva que eu havia tomado na noite anterior e, como estava anêmica, a febre se agravara ao ponto de chegar a ter alucinações.
No final, eu só precisava de descanso, uma boa alimentação e alguns remédios pra abaixar a temperatura e a pressão. Papai e os meninos faziam questão de fazer com que eu seguisse à risca o que estava escrito no atestado médico.
Naquela mesma tarde, quando minha febre baixou um pouco, recebi a visita de Angela, Jennifer e Sabrina. Conversamos sobre bastante sobre tudo, um pouco da escola, das coisas que aconteciam na mídia, de pessoas famosas e pessoas não famosas, de música, amigos, inimigos e amores. Nesse último assunto, eu me senti totalmente indisposta, e as meninas não insistiram. Prometi a elas que diria tudo o que quisessem saber quando estivesse com melhor disposição pra conversar. Voltamos a conversar sobre banalidades até que o horário de visitas havia acabado e as meninas se viram obrigadas a voltar pra casa. Antes, é claro, me deixaram informada sobre o conteúdo das provas de final de segundo bimestre.
Assim que me vi sozinha, ouvi o som da janela arrastando até se abrir por completo. Eu não desejava que Gregory voltasse tão cedo, ainda mais quando eu estava completamente desarrumada. Continuei deitada com os olhos fechados sem me mover, esperando que o colchão afundasse, revelando-o estar ali. Porém, eu só ouvi um toque no chão, revelando que ele havia pulado da janela para o chão.
- Sei que está acordada. – Sentei-me na cama como se acordasse de um pesadelo. A voz masculina não era de Gregory, eu não sabia se estava correndo perigo até ver o rosto de Alan.
- Alan, que susto! – Disse, colocando a mão sobre o peito e voltando a me deitar devagar. Eu havia ficado tonta por levantar rápido demais. – O que faz aqui?
- Quero falar com você. – Ele puxou uma cadeira, sentando-se de frente para o encosto dele. – Sobre o Gregory.
Senti minha cabeça girar mais uma vez ao ouvir o nome de Gregory. Eu esperava que, mais cedo ou mais tarde, ele viesse me ver novamente. Por mais que eu tentasse ficar brava com ele, eu não conseguiria e, mais cedo do que eu pensaria, eu o perdoaria. Mesmo que ele não merecesse.
- Sobre o que o Gregory te disse a respeito do... – Não pude terminar, Alan já se adiantara.
- Gregory não me disse nada. – Falou curto.
Fiquei confusa, então por que Alan veio me visitar? Gregory não havia dito nada, mesmo?
- Ele não te disse nada? – Perguntei, ainda um pouco confusa.
- Ele nunca me diria, somente se fosse algo importante. – Ele respondeu, sério.
- Então, por quê?... – Não precisei completar a frase para que ele entendesse o que eu queria dizer.
- Gregory está mal, e eu sei que a culpa é sua. – Alan foi direto ao assunto. – Quero saber o que disse para ele.
Senti-me uma pessoa horrível naquele momento, sabendo que fiz mal ao Gregory. Eu sentia necessidade de pedir desculpas à ele, à voltar a sermos amigos. Queria que ele estivesse ali agora. Mas eu sabia que se o fizesse, eu perderia a razão. Gregory havia matado uma pessoa, e mais outras quinze morreram por causa disso – de maneira misteriosa para mim. Como eu poderia perdoá-lo? Ele cometeu um crime bárbaro.
- Você é primo do Gregory, você deve saber os terríveis crimes que ele cometeu! – Mantive-me firme em frente à Alan. Ele apenas coçou discretamente a cabeça com um meio sorriso irônico. – Ele matou uma pessoa enquanto assaltava um banco.
- Ele nunca fez isso! – Defendeu-o.
- Ele confessou! – Rebati. – Ele confessou isso!
- Qual parte? A de matar uma pessoa, ou a de assaltar um banco?
Respirei fundo. Eu não havia mencionado “assalto à banco” na última discussão que tive com ele.
- Só a de matar uma pessoa. – Sentei-me na cama com as pernas cruzadas, colocando o edredom em volta de mim. – Ainda assim é um crime grave. Christopher disse que ele não mentiria, e ele estava certo, ele não mentiu.
- Por que ele não pode mentir. – Alan levantou-se da cadeira, colocando um travesseiro atrás das minhas costas, para que não me encostar à parede fria. – Ele fez um juramento sagrado. Se mentir, ele morre, por isso ele só oculta a verdade, assim como o Christopher.
- Como? – Arregalei levemente os olhos.
- Você achou mesmo que o Gregory mataria alguém sem razão? – Alan ironizou. – Ele nunca cometeria um crime por um motivo maléfico ou fútil.
- Mas... – Senti-me culpada. Eu havia julgado mal o Gregory por algo ruim de seu passado. Nem havia dado a ele uma chance de se explicar. – Christopher disse que ele matou um inocente.
- Gregory tinha quinze anos quando matou um ladrão de banco. Ele não tinha ficha na polícia, por isso ele era inocente. – Contou-me Alan. – Susan nos levou a um banco para sacar dinheiro quando anunciaram o assalto. Nos mandaram ficar quietos e juntos no mesmo lugar. Logo a polícia cercou o local e eles colocaram coletes com bombas em quatro reféns. Entre eles, estava eu: Um lobo não evoluído, que poderia morrer como um humano.
Senti um arrepio percorrer-me a espinha. Parecia que o frio que eu sentia havia aumentado, assim como a culpa por ter julgado mal Gregory. Alan continuava a contar a história.
- Éramos dezoito reféns, contando com dois seguranças feridos. Eles nos ameaçavam enquanto ordenavam a policia que enviassem um helicóptero para poderem fugir. Gregory se transformou de homem para lobo. Esta foi a primeira regra que Gregory descumpriu: Revelar-se na frente de um humano. A punição para isso era o banimento.
Senti meu nariz arder e a dor de cabeça aumentar. Eu sabia que iria chorar à qualquer momento.
- Gregory o atacou e o matou. Foi a segunda regra que ele quebrou. A de matar um humano. Sua pena foi a prisão perpétua, como vocês diriam. Os comparsas daquele ladrão acabaram se entregando, alegando que viram um garoto se transformar em um lobo e os reféns desmentiram, eles prometeram não falar à ninguém sobre o assunto como forma de gratidão por ele ter salvado suas vidas. Tivemos que fugir depois disso e viemos nos mudando constantemente desde então.
- Christopher disse que mais quinze pessoas morreram por causa dele.– Perguntei. Se Christopher não podia mentir, a história de Alan não batia com o que ele havia dito antes. – Ele mentiu?
- Eles morreram, sim. Eles sabiam a verdade sobre nós, por isso o conselho licantrópico quis certificar-se de que o nosso segredo não vazasse. Mandaram Christopher, Miguel e Pierre matarem todas as vítimas que sobreviveram ao assalto. Se Gregory não tivesse tido compaixão por mim ou pelas vítimas, elas não teriam morrido depois.
- Oh, meu Deus! – Instintivamente, levei as mãos ao rosto, chocada com tanta violência.
- No jornal, havia saído que um serial killer havia matado os sobreviventes do assalto. Desconfiavam ser um capanga do homem que Gregory havia matado, procurando vingança. Nunca acharam o homem, mas sabiam que ele matava as vítimas usando animais de espécie misteriosa, pois as marcas de dentes no corpo dos falecidos eram de um animal semelhante à um lobo, só que o tamanho da mandíbula era grande demais para ser de um lobo normal.
Senti as lágrimas escorrerem pelo meu rosto, meu nariz começar a entupir. Eu era uma péssima pessoa. Eu deveria ter ouvido a versão de Gregory, devia tê-lo deixado se explicar, deixar que ele me contasse a sua história. Ele havia tentado salvar a vida de dezessete pessoas, incluindo Alan e Susan.
- O Christopher realmente te disse a verdade. – Disse Alan. – Só que ele ocultou partes da história que o interessavam. Ele só disse à você coisas que sabia que iria pô-la contra o Gregory.
- E o que ele ganharia com isso? – Perguntei entre os soluços.
- A fraqueza do Gregory. – Disse unicamente.
- Eu sou a fraqueza do Gregory?
- É mais do que apenas a fraqueza dele... Você é tudo o que ele é. – Alan abriu a janela e pulou no parapeito, preparando-se para ir embora. – Ele ama você.
Aquilo atingiu-me com um impacto avassalador. Gregory me amava, e eu nunca sequer suspeitei disso. O que me surpreendia era eu estar mais feliz do que já estive um dia, porém eu estava deprimida e arrependida por fazê-lo sofrer. Eu queria vê-lo, pedir perdão de joelhos, se necessário e tocar seus lábios com os meus mais uma vez e vê-lo sorrir de novo.
Alan ergueu o corpo para saltar da janela, mas eu segurei a manga de sua jaqueta antes que ele o fizesse.
- Eu vou com você. – Levantei da cama, um pouco tonta e peguei algumas roupas dentro do armário.
- Não vai, não! Você está doente, tem que descansar. – Repreendeu-me Alan.
- É o seguinte: Doente ou não, eu vou, nem que seja pra ir sozinha. – Disse marrenta e intimidante. – E se você não me levar, eu saio por aquela porta e vou a pé pra casa dele. Se eu desmaiar na rua, a culpa será sua, entendeu?
Ele não viu outra opção a não ser me levar. Sabia que eu estava determinada em vê-lo aquela noite. Coloquei uma roupa agasalhada, prendi o cabelo do jeito que dava e, montada nas costas de Alan, saltamos da janela do meu quarto no quinto andar. Desci de suas costas quando chegamos perto de seu carro. Ele abriu a porta para que eu entrasse no banco de trás e depois entrou no lado do motorista.
- Ponha o cinto. – Disse Alan enquanto ligava o carro. Fiz o que ele mandava. Eu não suspeitava que ele dirigisse tão loucamente como Gregory.
Chegamos à casa dos Carl em menos de vinte minutos. Eu não havia entendido o que iríamos fazer lá, já que o meu objetivo era ir falar com Gregory. Alan saiu do carro e abriu a porta para mim.
- Você disse que... – Tossi forte, enquanto abria o cinto de segurança. – Você disse que iríamos ver o Gregory.
- Gregory está aqui. – Desci do carro e ele fechou a porta.
Eu não havia entendido o porquê. Gregory e Drew, pelo que eu havia percebido, haviam se estranhado de primeira. Eu me apoiava em Alan enquanto atravessávamos o jardim dos fundos. Eu me sentia bastante fraca por causa da febre e mal conseguia andar dois passos sem ameaçar desabar. Ele abriu a porta sem pedir permissão e entramos, fechando a porta atrás de nós. Estavam todos reunidos na sala de jantar: Susan, Carl, Drew e Gregory.
- Amanda? –Gregory levantou-se de sua cadeira, vindo amparar-me.
- Gregory, me perdoa. Eu... – Eu o abracei e beijei desesperada, sem terminar aquela frase.
Pensei que iria cair naquele momento, quando minhas pernas fraquejaram, mas ele me segurou e eu sabia que podia confiar nele. E não havia sensação melhor do que senti-lo perto de mim, sabendo que ele nutria um sentimento tão forte e tão bonito por mim, o mesmo que eu nutria por ele. Foi então que eu percebi que eu estava apaixonada por ele, que eu o amava e que eu queria estar ao lado dele para sempre, sentindo seus beijos, sendo a razão de seus sorrisos e risadas, da sua felicidade, assim como ele era a minha razão de estar aguentando todas as dificuldades e superando todos os obstáculos que apareciam para nos atrapalhar.
Ainda que quiséssemos continuar com aquele beijo, tivemos de interrompê-lo para buscar oxigênio. Ficamos em silêncio, esperando que as nossas respirações se normalizassem. Abri meus olhos, encarando-o. Ele olhava para mim, mas a sua feição era de preocupação.
- Começou... – Disse uma voz feminina conhecida.
Olhei na direção da dona daquela voz, não acreditando no que via.
- Mamãe? – Chamei-a. Estava com os cabelos mais curtos e levemente avermelhados nas pontas do que da última vez que me lembrava. Os olhos eram vermelhos sangue.
Minha cabeça girava e tudo parecia estar fora de controle novamente. Começava a escurecer e as vozes iam ficando mais baixas à medida que se passava os segundos.
- Amanda! – A voz preocupada de Gregory foi a última que ouvi antes de cair na profunda escuridão.
Capítulo VIII - Ascensão - Parte 1
Eu sentia como se estivesse sendo partida em duas. Eu tinha fome, uma fome insuportável. Também sentia dor, como se meu corpo estivesse apodrecendo de dentro para fora, como um pedaço de carne fora da geladeira. Eu não sabia o que estava acontecendo e tinha medo de descobrir o que era. Vagarosamente, entreabri os olhos, fechando-os rapidamente logo em seguida por culpa da claridade. Novamente, entreabri os olhos acostumando-me com a luz do abajur sobre minha cabeça.
Percebi-me num quarto de paredes sujas e escuras. O papel de parede que parecia ter sido um dia um vermelho-alaranjado despencava em certos pontos, expondo o tijolo agora de cor acinzentada, quase negra. Não havia janelas, somente uma porta de ferro tão suja quanto. A cama improvisada em que eu estava, naquele momento, em repouso, era confortável, mas era tão suja quanto. A mesinha de centro de madeira e a almofada que representava uma cadeira, juntamente da cama, eram os únicos móveis daquele cômodo.
Eu não sabia onde estava, por quanto tempo estava lá e o motivo de estar lá. Corri desesperada até o único meio de saída daquela cela, pelo que havia interpretado, e soquei-a, como se aquele feito pudesse derrubá-la, ou pelo menos, chamar a atenção de alguém.
- Socorro! – Gritei. – Alguém me ajude!
Não havia ninguém. Somente o som de alguns insetos rastejando por aquele lugar. Eles pareciam perto, mas eu os enxergava, com facilidade, na penumbra que cobria aquele cômodo, os mesmos no outro lado do cômodo. Por um momento, achei que estivesse vendo algo além do real, por conta do nervosismo, mas ao aproximar-me, constatei que o inseto – uma pequena lacraia que procurava se esconder em uma falha entre alguns tijolos expostos pelo papel de parede – realmente estava ali. Meus sentidos estavam apurados mais do que nunca.
Voltei para perto da porta, pedindo socorro. Eu tentava relembrar os últimos acontecimentos. Os motivos pelo qual Gregory estava sendo perseguido pela sua comunidade, a febre alta, o caminho para a casa dos Carl, o meu pedido de desculpas, aquele beijo... E ela. Então percebi que naquela hora, eu havia perdido a consciência. A frustração por não achar um motivo de estar trancada naquele lugar me dominaram. Não havia uma chave, ou qualquer material resistente que pudesse derrubar aquela porta. A parede, mesmo estando podre, parecia resistente o suficiente para continuar de pé durante uma guerra.
Aquilo era um forte, usado como uma cela, uma jaula para me conter. Tentei manter-me calma, mas as emoções naquele momento fluíam através de mim desenfreadas, transformando-me em uma besta selvagem que seria difícil de ser contida. Os momentos seguintes seguiam como flashes em minha mente. O meu ponto de vista mudar, tornando-se consideravelmente mais alto, como se eu estivesse sobre os degraus de uma escada, mas eu não estava; Logo, as paredes tinham adicionadas à elas marcas de garras como um novo toque de decoração, tornando-o mais assustador; A porta de ferro queimava sob minhas mãos, agora derrubadas; A escuridão não me parecia ser uma inimiga naquele momento. Ao contrário, estava a meu favor. Eu via, ouvia e sentia a presença de cada ser, cada respiração, cada batida do coração ritmado. Eles haviam me notado.
As cenas a seguir não foram as melhores. O corredor escuro, as escadas, uma porta no teto e eu estava um andar acima, mas ainda assim, no subsolo. Estavam todos lá, surpresos, porém não com a minha aparição. Eu os via por cima, a raiva e frustração, misturadas ao mau-humor causado pela fome insuportável. Todos se colocaram em posição de ataque, rodeando-me, tentando me domar. Rugi em resposta, preparando um contra-ataque. Tentei pensar com racionalidade por um momento, aquela realmente era eu? Eu realmente estava ameaçando meus amigos? Eles realmente pensavam em me atacar? Eu era tão perigosa assim? Minha mente escureceu novamente, a adrenalina aumentando com o prazer de me ver rasgando seus corpos.
- Maddy! – Era a voz de Gregory, logo atrás de mim. – Maddy, se acalme! Tente pensar!
- Ela não vai conseguir, temos que matá-la. – Gritou Susan. Eu podia perceber que aquele fora o seu plano desde o início.
- Não vai matar minha filha! – Disse Irene. Minha raiva havia aumentado ao vê-la. Eu a odiava. Odiava minha própria mãe.
Todos voltaram sua atenção total para mim, depois do meu segundo rugido. Feroz, empurrei uma mesa para a direção de qualquer um. Eu só via as cenas de luta passarem diante dos meus olhos, todos, agora transformados, inclusive Irene, tentavam deter-me. Eu não deixaria que me domassem.
O que parecia ser somente uma briga de cachorros grandes era como uma guerra para mim. Eu me via cercada pelos meus aliados. Os dentes perigosamente pontudos estavam expostos, os lábios tremiam ameaçadoramente, o focinho enrugado e os olhos concentrados na figura de um monstro. O mesmo monstro estava refletido em seus olhos, nos olhos de cada um. Os olhos que olhavam para mim, uma aberração, uma besta sedenta por carne e destruição. Pela maldade. Era eu, mesmo que eu não me reconhecesse debaixo dos pêlos brancos.
Eu não tive mais tempo de pensar direito. Minha mente escureceu novamente, as imagens voltando a passar como slides fronte aos meus olhos: As garras, as investidas contra eles, as deles contra mim, os sons de objetos quebrando, as presas... Eu me sentia alucinada.
Em uma de minhas investidas, acertei dois lobos de uma só vez. Só então, percebi o que havia feito: Do outro lado do cômodo, o lobo de pêlo caramelo que eu conhecia muito bem mal conseguia pôr-se de pé.
- Gregory, me perdoe! – Pedi, o desespero aparente na voz. Aproximei-me de seu corpo, a ferida aparente por entre os pêlos.
À medida que seu tamanho diminuía, o focinho tomava a forma de um rosto humano, eu podia ver, no reflexo de seus olhos, o meu próprio corpo voltando à verdadeira forma – ou talvez aquele animal que eu havia me transformado fosse a minha verdadeira forma e a minha aparência com a que eu já estava acostumada era apenas uma máscara. Eu não sabia ao certo.
- Não se preocupe, não é grave. – Resmungou Gregory, encostando-se a parede. Mesmo que ele dissesse aquilo, eu continuaria preocupada. - Só preciso descansar.
- Drew, me ajude a carregá-lo. – Disse Alan. Todos haviam voltado ao normal.
Drew, a contragosto, ajudou Alan a carregá-lo para o andar superior. Susan subiu logo depois, ela nem havia se lembrado de ofender-me pelo tanto que estava preocupada com Gregory. Agora estávamos somente eu, Irene e Carl. O mesmo havia jogado um cobertor sobre meu corpo para tampar minha nudez.
- Eu quero ajudá-lo! – Falei, correndo em direção à escada, porém fui puxada com rudez e jogada na única poltrona que havia sobrevivido à pequena batalha. – Carl!
- Deixe que cuidemos dele, há coisas que precisam ser esclarecidas. – Foi a última coisa que o mesmo disse antes de trocar olhares com Irene e subir também.
Franzi o cenho, eu reconhecia aquele olhar muito bem. Era o mesmo olhar que eu tinha quando via Gregory. Era amor! Estavam apaixonados um pelo outro! Praguejei mentalmente, analisando-a. Então ela havia trocado o meu pai pelo melhor amigo dele? Que belo melhor amigo!
- Está apaixonada por ele! – Acusei-a. – Abandonou meu pai por ter se apaixonado por ele!
- Eu não o abandonei! Eu o salvei! – Defendeu-se.
- O salvou de quê? – Perguntei irônica, não esperando que ela respondesse.
- De você!
Capítulo VIII - Ascensão - Parte 2
Eu estava na sala de estar, agora devidamente vestida com um macaquinho azul-turquesa emprestado de Susan. A roupa ficava larga em mim devido a eu ser menor que ela. Depois de muito implorar, Carl havia deixado que eu visitasse Gregory em seu quarto – uma vez que Drew e ele haviam se estranhado e o mesmo não deixou que o levassem até seus aposentos. Gregory havia dormido por ter perdido muito sangue. Pedi que o levassem à um hospital. “Não é preciso. Lobos tem a capacidade de se recuperarem seis vezes mais rápido do que humanos. Alguns dias de descanso e ele estará bem novamente.” Disse Susan, o que me aliviou por um momento, mas mesmo assim, eu estava preocupada. Susan parecia querer decepar minha cabeça pelo que havia feito ao seu irmão mais novo.
Logo, Carl pediu para que eu tomasse um banho e relaxar. Ele prometeu que me traria algumas roupas limpas antes que saísse do chuveiro, e cumpriu, deixando um macaquinho azul perto da porta do banheiro.
- Irene te falou tudo? – Drew interceptou-me no caminho para a sala.
- Não, acabamos discutindo e eu saí daquele lugar. – Limitei-me a dizer. – Com licença.
Novamente, Drew não permitiu que eu passasse.
- O que ela tem para te falar é importante. – Alertou-me.
- Ninguém precisou me dizer que a raiva é o estopim pra minha transformação. – Avisei-o. – Então é melhor não me aborrecer.
Depois disso, ele deixou que eu passasse, mesmo à contragosto. Sentei-me no sofá na sala de estar, olhando para um ponto qualquer. Minha cabeça, mais do que nunca estava mais confusa. Eu tentava entender o porquê Irene, minha mãe que havia abandonado meu pai e a minha família havia voltado depois de tanto tempo; o que ela queria dizer com ter salvado meu pai de mim? O porque de ela ter escolhido fugir ao invés de assumir seus sentimentos por Carl? Por que eu era uma loba... Eram milhões de perguntas e eu não havia achado respostas para nenhuma delas.
Irene aproximou-se lentamente, caminhando sem fazer um único som no chão de madeira. Ela sentou-se de frente para mim, em uma poltrona, esperando qualquer reação minha. Controlei minhas emoções, engolindo a raiva que sentia somente de olhar para ela.
- Precisamos conversar. – Ela disse depois de algum tempo.
- Vai dizer que a culpa é minha? – Perguntei sarcasticamente.
- Não. – Ela balançou a cabeça negativamente. – A culpa é minha. – Sua voz estava carregada de amargura. – Você conhece a história de como eu e seu pai nos conhecemos, não é?
- Conheço. – Respondi friamente. – Se conheceram no colegial, engravidou de mim, enfrentaram dificuldades, superaram obstáculos e depois vieram os gêmeos.
Ela sorriu satisfeita.
- Essa história não é totalmente verdadeira. – Confessou. – Eu fiz com que seu pai prometesse nunca contar a verdade pra você.
- Por quê? – Perguntei indignada. – Por que eu não podia saber?
- Eu conheci seu pai quando tinha quinze anos. Ele era repetente e eu era caloura. Tornamo-nos amigos e depois começamos a namorar. Enfrentamos preconceitos por ele ser branco e eu negra, mas continuamos juntos. No ano seguinte, Carl havia entrado na escola e eu me apaixonei por ele, e ele me correspondeu. Eu não queria dizer ao seu pai que eu havia me apaixonado por outra pessoa. Apesar de ele parecer uma pessoa forte, ele era sensível demais. Eu pensei que poderia esconder de todos uma relação com Carl... Havia dado certo até que eu fui arranhada por ele e me tornei uma loba. Pra piorar a situação, eu engravidei no ano seguinte, mas não era do Paul. Era do Carl.
Eu não havia acreditado no que ela havia acabado de contar. Raciocinei por um momento: Se ela havia engravidado de Carl, isso me fazia filha dele e não de Paul. Ela havia enganado meu pai por tanto tempo!
- Eu sou filha do Carl? – Perguntei, a voz falhada.
- Não, é claro que não! Você É filha do Paul! – Corrigiu-se rapidamente. – Mas não é minha primeira filha. Eu engravidei de Drew.
Novamente um novo choque. Eu era meia-irmã de Drew. E depois de pensar um pouco, ele tinha um bom motivo para me odiar. Irene havia se casado com meu pai, ele se tornou o filho bastardo, mesmo sendo mais velho.
- Eu não podia ter um filho lobo, era perigoso e eu não podia dizer ao Paul a verdade. Era contra as regras. Também não podia fazer um aborto, o feto era muito forte. Eu tive que esperar até o dia do parto e fingir que o bebê havia nascido morto. Seu pai ficou arrasado quando ouviu a notícia. Eu entreguei o bebê ao Carl para que ele o criasse e depois disso, nos separamos, mas eu sempre o visitava para ver Drew crescer e se desenvolver. – Ela sorriu amargamente, mal aguentando a vontade de chorar. – Um anos depois, eu casei com seu pai e Carl se mudou da cidade quando a guarda descobriu que ele havia me transformado. Ele havia quebrado uma regra e havia sido banido. Por coincidência, seu pai e eu nos mudamos dois anos depois para o mesmo bairro que Carl. Eu estava grávida de você na época e estava feliz, foi então que Carl me contou que você iria morrer depois que nascesse.
- Por quê? – Aquela história era quase inacreditável.
- Por que você era uma Mestiça, era filha de um humano e uma loba. É diferente de ser uma sangue-puro ou uma transformada. Você não sobreviveria porque parte do seu sangue é humano e a outra parte é de lobo, e a parte lobo destruiria qualquer célula, órgão, neurônio que tivesse sangue humano. Você iria morrer como um bebê com lúpus. Eu esperei você morrer. Esperei um dia, uma semana, um mês... – Naquele momento ela sorriu alegremente, em um momento de nostalgia. – Mas você não morreu e eu fiquei feliz por você ter sobrevivido, fiquei muito feliz. Eu te criei como uma criança normal, o que foi um erro, eu devia te preparar para ser uma loba. Quando você ia completar oito anos, você começou a dar os primeiros sinais de ascensão: Se irritava facilmente e por nada, os olhos mudavam constantemente para vermelhos, sumia dentro do bosque, falava mais com os animais do que com as pessoas, começou a comer carne...
- Eu sempre comi carne. – Falei baixo.
- Você passou a ser vegetariana depois de descobrir que bacon era porco. – Ela riu. – Eu fiquei feliz quando você optou por ser vegetariana aos seus três anos, mas depois que você começou a dar muitos sinais, eu decidi ir embora. Era perigoso para o seu pai se você ascendesse perto dele. Se você não o matasse, a guarda o mataria e nos caçaria.
- Se eu estava ascendendo, por que você foi embora? Sem você por perto, eu ia matá-lo! – Gritei, enraivecida. Eu começava a perder a paciência, sentia a mesma adrenalina que senti quando me transformei pela primeira vez.
- Eu estava puxando o seu lado animal para fora! – Ela gritou mais alto. – Por que eu sou loba! Eu tive que ir! E eu sempre senti a sua falta... Sempre senti a sua falta, a falta do Drew, do Richard e do Gabe. Sempre os amei! E foi difícil pra eu sobreviver sem vocês por perto. – As lágrimas rolavam pelo seu rosto. – Antes de ir embora, eu pedi ao Carl para me arranjar identidades falsas e se tornar amigo do seu pai, ele ia precisar. Pedi a ele que mudasse a idade de Drew pra colocá-lo na mesma escola que você pra te vigiar, te ajudar no que fosse preciso.
Levantei do sofá, andando de um lado para o outro. Era muita informação para processar de uma só vez. Ao contrário do que imaginei, eu nasci uma loba. Era pra eu ter morrido, mas eu sobrevivi de uma maneira inexplicável. E eu tinha um irmão mais velho que me odiava e irmãos gêmeos pequenos que... Então meus pensamentos voltaram-se automaticamente para meus irmãos gêmeos.
- Richard e Gabe são... Lobos também? – Perguntei incrédula.
- Não, eles não são. Eu os adotei por que eu sabia que seu pai não ia aguentar quando me separasse dele. Ele precisava de um apoio, e vocês foram o apoio dele. Ele sempre se dedicou à vocês de corpo e alma, e isso era algo que sempre admirei nele. Paul é um ótimo homem, por isso eu não podia deixá-lo morrer. Foi por causa do meu egoísmo que tudo aquilo começou. Faltava seis meses pro seu aniversário de nove anos quando conseguimos adotar os gêmeos. Eles tinham dois meses quando chegaram até nós. Quando você fez nove, eu pedi o divorcio e fui embora.
Era difícil acreditar que havia tanta mentira por trás do meu passado. Todos haviam mentido para mim: Meus pais, Carl, Drew... Eles sabiam de tudo e não me contaram. Era realmente para proteger minha família? Eu era tão perigosa assim? Se sabiam disso, por que não me matar? Seria mais fácil. Eles podiam inventar qualquer mentira e ficaria convincente. Eu não tinha com quem desabafar, não tinha alguém confiável. Eu não podia acordar Gregory no andar de cima e jogar em cima dele todos os meus pensamentos confusos.
- Onde está indo? – Perguntou Irene quando me viu colocar as sandálias, preparando-me para sair.
- Pro hotel. – Respondi breve. – Preciso falar com meu pai.
- Você não pode! – Em poucos segundos, ela se postou em minha frente, bloqueando a saída.
- Por quê?
- Por que você tem que continuar desaparecida!
- Desaparecida? – Repeti sem entender.
- Seu pai pensa que está desaparecida, Amanda, e você tem que continuar assim. – Disse uma voz masculina, era Alan.
- Por quê?
- Por que se você voltar como loba, o Christopher terá autorização para te matar e matar o seu pai. – Disse Susan, aproximando-se. – E se isso acontecer, eu te busco no inferno e te mato outra vez. – Ameaçou-me.
- Eu não posso sair daqui? – Perguntei baixinho.
Alan negou com a cabeça.
- A polícia não pode encontrar você. – Falou Susan.
- E o que eu posso fazer?
- Por enquanto, só esperar. – Irene deu aquele assunto por encerrado.
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Haviam se passado quatro dias desde então. As férias do Spring Break haviam terminado, então Alan, Drew e Gregory – agora totalmente recuperado – se viam obrigados à voltar à escola como alunos normais. Eu havia imigrado da casa de Carl para a casa de Gregory e dormia em um quarto de hóspedes. Christopher e seus companheiros não haviam dado notícias desde nossa última conversa, e isso me incomodava bastante. Eu sentia que eles estavam formando um plano para nos pegar, mas a sensação de estar sendo vigiada havia desaparecido.
Eu me sentia sozinha, apesar de agora não ter dúvidas sobre os meus sentimentos sobre Gregory e o tipo de relação que tínhamos. Era algo especial, mágico, não parecia ser só um namoro de adolescente, mas era como chamávamos o que tínhamos, mas mesmo assim me sentia sozinha porque não havia alguém que eu pudesse desabafar sobre o que eu havia descoberto. Naquele momento, lembrei-me de minhas melhores amigas: Lety, Sabrina e Jennifer. Elas me ouviriam, mesmo que fosse a coisa mais absurda do mundo.
Calcei um tênis e coloquei uma blusa e calça de ginástica, pondo os óculos escuros e um boné na cabeça. Decidi que sairia daquela casa e iria à escola para, pelo menos, ver minhas amigas de longe. Certifiquei-me de não fazer barulho ao descer as escadas, Susan estava em casa e deceparia a minha cabeça se me visse fazendo alguma besteira. Fechei a porta com cuidado ao sair, evitando fazer qualquer barulho e corri em velocidade sobre-humana até chegar ao bosque e refazer todo o trajeto que fazia para ir à escola.
Estava tudo normal. Candace e seu grupo importunava algumas meninas que passavam ali perto de seu carro, alguém estava com o som do rádio alto tocando alguma música pop, algumas pessoas desciam do ônibus conversando animadamente... E então, Sabrina chegou saindo carro do irmão dela, parecia desaminada ao sair do carro. Subi em uma árvore, escondendo-me entre as folhas, para poder ver melhor. Angela e Jennifer saíram do prédio e se apoiaram em uma mureta esperando que ela se aproximasse. Apenas se cumprimentaram antes de entrar novamente no prédio da escola. Não demorou muito tempo depois para que Gregory saísse do prédio e se apoiasse em seu carro. Ele esperou alguns minutos até que as duas motos conhecidas estacionaram ao lado de seu carro.
Eram Miguel e Pierre. Ao contrário do que imaginei, Gregory não ficou tenso em nenhum momento e manteve uma conversa civilizada com eles. Eu não conseguia ouvir o que diziam, falavam baixo e rápido para que ninguém lesse seus lábios ou os ouvisse. Nem mesmo minha audição conseguia escutar o que diziam. Não demorou muito, os três se despediram com um breve aceno de cabeça antes de cada um para seu canto. Depois de quase duas horas, era o horário de almoço. Todas as turmas haviam descido e alguns iam para o estacionamento perto de seus carros. Rapidamente, saltei para outra árvore mais baixa, dali eu podia ouvir bem perto da mesa que eu e minhas amigas costumávamos sentar. Angela foi a primeira a chegar com sua bandeja, logo depois, vieram Jennifer e Sabrina com seus almoços. Elas começaram a falar sobre um assunto qualquer até chegar sobre o meu desaparecimento.
- Sinto falta da Maddy. – Disse Angela, dando um suspiro logo em seguida. – Queria saber onde ela está.
- Tomara que esteja bem. O Sr. Portland disse que ela estava doente, chegava até a ter alucinações e sumiu de repente. – Falou Jennifer. – Ela não saiu pela porta, então ela deve ter pulado a janela. Mas é muito alto, será que ela sobreviveu?
- Vira essa boca pra lá! – Angela deu um peteleco na testa da Jennifer. – Ela está bem, pode ter certeza disso. Só tem que achá-la.
- Eu gosto da Maddy, ela é uma pessoa maravilhosa, mas a gente não pode descartar essa possibilidade. – Jennifer estreitou os lábios. – Ela está desaparecida há duas semanas.
Duas semanas? Será que eu havia ficado mais que um dia inconsciente naquela cela? Eu só estava escondida há quatro dias.
- Quer saber, eu vou investigar isso. – Disse Angela de repente. – Eu vou pesquisar e tentar achar a Amanda.
- Vai lá, gênio, até parece que você vai fazer uma investigação melhor que a polícia. – Caçoou Jennifer, aborrecida.
- Fica na sua antes que eu te dê um cascudo! – Resmungou Angela.
- Olha, meninas, mesmo que estejamos preocupadas com a Maddy, temos que nos focar nos estudos. Ainda mais por que as duas ficaram de recuperação, então... – Sabrina lhes deu uma bronca.
Elas começaram um novo assunto até que Miguel e Pierre sentaram-se na mesma mesa que elas. Para minha surpresa, os dois beijaram as bochechas de Jennifer e Sabrina, causando inveja nas outras garotas. Eles pareciam estar seduzindo elas. Como eu tinha vontade de saltar daquela árvore e arrancar a cabeça dos dois por brincarem com minhas amigas. Porém, a única coisa que pude fazer foi respirar fundo e evitar que me transformasse novamente. Começaram a falar sobre um tema qualquer até que novamente o assunto voltou a ser meu desaparecimento.
- E então, houve progresso na investigação? – Perguntou um deles, Pierre.
- Não, infelizmente. – Respondeu Sabrina, apoiando a cabeça no ombro do que perguntou.
- Então o paradeiro dela continua desaparecido? – Perguntou Miguel, a mão entrelaçada com a de Jennifer.
- É. – Respondeu, Angela. Ela parecia incomodada em meio aos casais.
- Tomara que a encontrem, logo. – Disse o primeiro, um sorriso amargo nos lábios. – Gregory parece bastante afetado, ele gosta dela de verdade.
Não parecia ter sentido, Greg me via todos os dias, por qual motivo ele sentiria saudades de mim? Eu tentava entender o porquê disto, não era a primeira vez que eu algo de tal gênero vindo delas. Talvez ele tentasse passar uma imagem de amigo preocupado, ou talvez para se certificar que a polícia ou os nossos inimigos não soubessem de nada? Aquelas pareciam às respostas mais próximas de serem corretas.
- Não acha melhor mudarmos de assunto? – Disse o outro. – Falar do desaparecimento da Amanda a todo o momento não a fará aparecer em um toque de mágica, e isso faz tudo ficar mais mórbido e deprimente.
- Tem razão, Miguel, melhor mudarmos de assunto. – Disse Jennifer, acomodando-se no meio abraço de Miguel.
Eu me preparava para saltar da árvore quando o novo assunto me intrigou.
- E então, conseguiu convencer o Al a vir conosco no cinema? – Perguntou Sabrina animada a Angela.
- Não, infelizmente. O Alan é muito reservado e caseiro, não curte “sair de casa para ir a uma sala escura pra ver um filme qualquer que se pode ver na televisão.” – Angela disse provavelmente imitando-o no final da frase.
Então Alan e Angela estavam saindo? Eu me perguntava se era por causa dos gêmeos que ele havia resolvido começar uma relação com Angela ou se era o que ele mesmo queria. De todo modo, eu me sentia extremamente aliviada por saber que havia alguém protegendo minhas amigas.
Saltei para outra árvore e depois pousei silenciosamente no chão. Mesmo desajeitada, eu havia conseguido ser discreta e não chamar atenção de quem estivesse no estacionamento. Mas ao contrário do que eu havia pensado, eu havia sido descoberta. O perfume animalesco estava tão forte que eu sabia que ele estava por perto, mesmo que eu não houvesse o sentido chegar.
Brusco, apertou-me o braço esquerdo quase ao ponto de quebrá-lo. Gregory estava extremamente furioso, o que não era um bom sinal.
- O que você está fazendo aqui?
ATENÇÃO! Cenas de violência à seguir.Capítulo IX - Confronto
Eu procurava não deixá-lo mais irritado do que já estava, mas parecia impossível. Gregory soltou meu braço, respirando fundo tentando não se agitar. Os olhos pareciam querer mudar para vermelhos, o que não era um bom sinal. Depois de alguns segundos que pareciam horas, ele abriu os olhos que estavam de volta à cor habitual: Azuis.
- Perguntei o que está fazendo aqui.
- Queria ver minhas amigas! – Sua expressão mudou de repente para um misto de preocupação com insatisfação – Mas eu não falei com elas, eu as vi de longe!
- Isso não justifica nada! Nossos inimigos podem sentir o seu cheiro à quilômetros! – Elevou o tom da voz. – Agora volte para casa e continue escondida!
Ele deu aquele assunto por encerrado. Logo se voltou para trás, preparando para ir embora, mas eu ainda tinha coisas para perguntar.
- O que você falou com Miguel e Pierre?
Ele parou de andar, apoiando a mão direita na árvore e olhou para mim. Os músculos estavam tensos, o maxilar trincado. A árvore fez um pequeno ruído e inclinara para a direita.
- Não posso te contar. – Limitou-se a responder.
- Eu sou uma de vocês agora, você pode sim me contar! – Elevei o tom de voz. – Não me trate como se eu fosse uma inútil.
- Eu não estou te tratando assim! – Defendeu-se. A árvore voltou ao lugar, caindo algumas folhas quando ele a soltou e se aproximou rapidamente. – Nunca te tratei como se fosse incapaz de fazer qualquer coisa.
- Então não me diz!? – Naquele momento, gritei de verdade. Eu já não me lembrava de tentar me acalmar. Eu não me importava se iria me transformar ou não. – Por que não trata como uma de vocês?
- Eu só não posso te dizer!
- Você não pode ou não quer?
Ele se manteve calado. Se ele mentisse, ele morreria, então ele não disse nada. Era o suficiente para mim.
- Você não confia em mim. – Mesmo que eu houvesse dito aquela frase muito baixo, eu sabia que ele havia escutado.
- Amanda...
- Não me siga! – Foi a última coisa que disse antes de correr em alta velocidade pelo bosque.
Eu havia parado em uma rua distante da escola. Eu não conhecia aquele local, mas eu sabia que o cheiro de carne foi um dos principais motivos de eu ter parado lá. Eu sentia a mesma fome insuportável que senti dias atrás, e eu sentia que era impossível resistir àquele cheiro. Pulei a cerca que separava o jardim da rua apressando o passo até o quintal dos fundos – o cachorro, um rottweiler de aproximadamente três anos, encolheu-se e choramingou ao me ver. Os donos da casa faziam um pequeno churrasco para o almoço ao ar livre. Não queria atacar uma família inocente, então me esforcei ao máximo para que não me transformasse e os matasse.
Demorou algum tempo até que eles entraram em casa para buscar o complemento, enquanto isso, eu já havia pegado todas as carnes cruas, certificando-me de não deixar qualquer rastro para trás. Deixei um bife para o cachorro e pulei a cerca novamente, correndo para minha antiga casa em velocidade sobre-humana.
- Não sabia que roubava carne, agora. – Era Gregory. Ele estava sentado no capô de seu carro.
- É por que eu não podia te contar. – Disse sarcástica. – Eu disse para não me seguir.
- Não te segui. – Confessou. – Só imaginei aonde você iria estando tão... – Procurou uma palavra que definisse meu estado. –... Desequilibrada.
- Já descobriu, agora pode ir embora.
Ele saltou do capô e me prensou contra o carro, o mesmo balançou por causa da força. Eu não havia sentido mais do que uma pressão, mas se eu fosse uma humana como eu era antes, teria quebrado alguns ossos.
- Você os perdoaria? Perdoaria Miguel e Pierre? – Que pergunta absurda era aquela?
- É claro que não! – Falei como se fosse óbvio. – Eles tentaram nos matar!
- É por esse motivo que eu não posso te contar! – Ele se afastou, passando a mão pelos cabelos. – Você iria estragar tudo.
- E como perdoá-los faria tudo dar certo? Como ficaríamos em paz? – Eu começava a ficar confusa e agitada.
- Eles não tiveram escolha! Quando o conselho recruta alguém pra guarda, você é obrigado a aceitar!
- Do que você está falando?
- Eu ascendi aos meus três anos. Nessa idade, meu poder se igualava ao de Christopher. Eu era forte, tinha controle sobre meus sentimentos humanos e sobre minha parte animal. O conselho tinha interesse em mim, queriam me recrutar como general quando eu fosse mais velho, mas então aconteceu aquele assalto e eu fui banido, depois caçado. Eu me senti aliviado por um lado, mas angustiado por outro. Eu não poderia mais ver meus pais. – Ele encostou-se no carro, fazendo-o balançar novamente. Ele não tirava as mãos do rosto, revelando seu nervosismo. – Miguel e Pierre não tiveram a mesma sorte. Eles ascenderam depois e não eram tão fortes quanto eu, mas eram extremamente inteligentes, e isso atiçou o interesse do conselho. Eles foram recrutados pra guarda como parceiros de Christopher.
- Você quer dizer que eles... Só tentaram nos matar por obrigação? – Por um momento, tentei sentir como Miguel e Pierre se sentiam. Ter a responsabilidade de ser algo que não desejavam, suportar ter que matar seus companheiros, humanos, pessoas inocentes. Acho que não suportaria ser eles.
- Eles me viram crescer. Eu não era nada mais do que um vizinho deles, mas criamos um laço tão forte quanto o que tenho com Alan. Você não deve imaginar o quanto foi difícil para eles ter que nos caçar, e não imagina o quanto é difícil para eu ter que tratá-los como inimigos. – Ele olhou para mim. Seus olhos transpareciam sua amargura. – Eu não estaria livre hoje se não fosse por eles. Foram o Pierre e o Miguel que conseguiram fazer com que eu, Alan e Susan conseguíssemos fugir. Então agradeça a eles por eu ter conhecido você.
Era muita informação para processar. Parecia que nos últimos seis meses minha vida haviam virado um filme de ficção, mistério e ação. Havia muita coisa que eu havia descoberto de uma só vez: Lobisomens existiam, o garoto pelo qual me descobri apaixonada é um lobo foragido e havia matado uma pessoa, outros lobos querendo minha cabeça, minha mãe é uma loba, eu sou uma loba, o melhor amigo do meu pai é um lobo, o garoto que mais me odeia no universo é meu irmão mais velho, meus irmãos mais novos são adotados, meus inimigos não são bem inimigos... Era muita coisa para processar...
- Mas isso não justifica eles usarem minhas amigas para chegarem até mim.
- O problema é que você sente tanta raiva deles que não percebe que eles também têm sentimentos. – Ele sorriu torto, como se tivesse um momento de nostalgia. – Jennifer é tipo de garota perfeita pro Miguel, assim como Sabrina é perfeita pro Pierre. Eles são loucamente apaixonados por elas, assim como Alan é pela Angela.
Nunca havia passado pela minha cabeça que o que eles sentiam era amor de verdade. Para mim, eles eram tão maldosos que não haveria qualquer vestígio de um sentimento em seus corações. Não sabia o que responder.
- Eu sempre pensei que... O Alan... Fosse gay. – Admiti, lembrando-me da primeira vez que os vi.
- Pra ele é mais fácil acabar com qualquer esperança de uma garota pra sair com ele do que dizer não a cada uma. Algumas são muito insistentes, e isso acaba o irritando, de certa forma. Ele prefere não chamar atenção. Gosta de coisas práticas. – Ele riu por um segundo. – Engraçado é como ele se apaixonou por uma garota que é exatamente o contrário dele.
Pensando daquela maneira, era realmente algo engraçado. Não consegui evitar que uma risada escapasse da minha boca. Um silêncio se instalou entre nós. Eu imaginava o que ele estava pensando, e eu pensava em cada palavra que ele havia dito e no sentido que elas tinham. Mesmo que ele houvesse explicado tudo, ainda estava em dúvida sobre uma coisa:
- E o Christopher? Ele não é como eles, é? – Perguntei baixinho.
- Não, ele não é. – Confirmou – O Christopher é maligno por sua própria natureza. Desde que o conselho decidiu me recrutar na guarda como um dos generais, ele não aceitou isso. Havia demorado anos para que ele chegasse à tal posto, e um pirralho de três anos iria se tornar general só por causa de seu poder. Nisso, ele passou a me odiar, mas ele não podia encostar um dedo em mim, para sua frustração. Eu era protegido pelo conselho. E eu me tornaria general aos meus quinze anos.
- Devia ter me dito antes... – Mordi uma unha, pensando. – Se eu soubesse, talvez eu não roubasse essa carne crua.
Ele riu em resposta. Logo, antes que chegássemos em casa, o pote de carne crua estava vazio.
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Naquele mesmo dia, encontrei-me sozinha em casa. Eu havia arrumado toda a casa e aproveitado para fazer uma pequena ceia para os inquilinos. Só havia achado carne no freezer e não tinha uma maneira de poder sair e comprar um complemento. A polícia estava à minha procura em qualquer lugar que fosse e haviam espalhado fotos minha por todo o bairro. No final, o jantar era apenas carne cozida com molho de churrasco. Pra mim, somente aquilo estava bom.
Mais tarde, Alan mal pôs os pés em casa, saiu apressado alguns minutos depois de ter chegado, apenas para saciar a fome. Consegui segurá-lo alguns segundos antes de sair e conversar com ele sobre Angela. Ele havia dito que iria ao cinema com ela. Ri internamente me lembrando. Ela havia conseguido convencê-lo, como sempre. Susan havia avisado que iria se atrasar, pois seu chefe havia prendido ela com alguns relatórios. Não era algo que a prenderia por muito tempo, pensei, talvez ela estivesse apenas querendo me evitar, uma vez que ela me odiava e não podia me matar por causa de Gregory. Dei de ombros, também não gostava dela. Já Gregory resolveu não falar para onde iria e decidi não perguntar nada, afinal, havíamos acabado de fazer as pazes e eu não queria começar outra discussão.
Apesar de saber que não havia nada que eu pudesse fazer, eu me sentia solitária aquela noite.
- Senhorita Portland... – Ouvi uma voz masculina ao longe, baixa e suave. Não havia como não reconhecer aquela voz. Era a voz maligna de Christopher.
Pus-me em posição de defesa, sentindo a adrenalina começar a correr por minhas veias. Ele estava perto o suficiente para que eu o escutasse, mas longe o suficiente para que eu não sentisse seu cheiro ou sua presença. Ele queria se esconder? Ou queria me pegar desprevenida? Caminhei para fora de casa, sentindo o pequeno resquício do aroma animalesco de Christopher e o segui correndo por dentro da avenida até parar naquele bosque. Deparei-me com Christopher e os gêmeos. Segurei a vontade de lançar a eles um olhar de compaixão para que Christopher não desconfiasse. Talvez eles não soubessem sobre o que acontecera mais cedo, ou talvez soubessem.
- Ora, ora. Então é a pura verdade. – Christopher sorriu maliciosamente. – Parece que a senhorita tornou-se uma de nós. Mas ainda assim, continua uma sangue-ruim.
- Ora, seu... – Engoli um desaforo ao perceber que Miguel havia avançado um passo. – Queria somente constatar isso, que sou uma loba agora?
- Claro. – Ele respondeu, um tom de superioridade na voz. – Agora, sou obrigado a te matar por ser uma transformada. E de brinde, matarei o seu querido Gregory também.
Senti o coração apertar ao ouvi-lo falar com tanta veemência e contentamento sobre a oportunidade de nos matar. Do mesmo modo, senti a raiva e a adrenalina ameaçarem circular por minhas veias, como em um reflexo de defesa.
- Não o machucará! – Gritei, tentando manter-me calma.
- Ele não irá nos machucar, Maddy. – Corrigiu uma voz conhecida enquanto se postava ao meu lado.
O aroma animalesco que se desprendia dele e de todos os outros apareceram de repente, como se tivessem aparecido em um toque de mágica. Ao mesmo tempo em que Gregory e o resto da tropa se postaram ao meu lado em posição de ataque, Miguel e Pierre caminharam até nosso lado. Senti-me levemente relaxada e feliz, tínhamos mais aliados agora.
- Estou desapontado com vocês, meninos. – Disse Christopher. – Mas eu tenho uma informação muito mais valiosa para entregar ao conselho agora, não é mesmo, senhorita Portland.
Éramos nove contra um – uma virada de jogo inesperada, confesso. Eu sentia naquele momento que havia quebrado barreiras resistentes e que podia ser e fazer tudo o que eu quisesse, nada me impediria agora. Nem mesmo um conselho ancião de lobisomens.
- Gregory não será morto, ele não fez nada de errado. – Falei confiante.
- Ora, como não? Revelar-se a um humano, matar um humano, transformar um humano... – Seu sorriso era maléfico.
- Eu não fui transformada nem por ele e nem por ninguém! – Gritei. – Eu sou uma Mestiça! Sou filha de uma loba e um humano... Eu nasci assim.
Capítulo X - O Ponto
- Mentirosa. - Christopher disse, seu olhar se voltou para Gregory, esperando uma confirmação. O sorriso vitorioso de Gregory foi sua resposta. - Impossível... Mestiços nunca sobrevivem.
- Eu sobrevivi. - Respondi em um tom de voz vitorioso.
Seu olhar se tornou catatônico por alguns segundos, como se buscasse uma solução pro novo problema que tinha nas mãos.
- Não importa. - Ele declarou, voltando à sua habitual expressão maliciosa. - Eu vou matá-los do mesmo jeito.
- Desista, Christopher! – Gritou Susan. – Você está sozinho, somos nove contra um, se ainda não percebeu. – Se vangloriou.
A risada alta e sarcástica que Christopher proferiu fez com que todos os pêlos do meu corpo se arrepiassem. Eu sentia que algo muito pior estava por vir, e Christopher não era bobo. Ele não havia se surpreendido quando Pierre e Miguel se aliaram a nós. Ele olhou com um olhar debochado para Susan, a língua estalando no canino direito.
- Você nunca foi muito inteligente, não é, Susan? – Ofendeu-a. – Eu nunca viria sozinho.
Olhei ao redor. Grunhidos, latidos tão estrondosos que poderiam ser confundidos com o som de trovoadas. O bosque havia se inundado com os diversos aromas animalescos que se desprendiam de todos aqueles lobos. Quantos devia haver? Vinte? Trinta? Era impossível distinguir todos aqueles cheiros uns dos outros. A maioria deles estava transformada. Alguns semi-transformados, uma mistura um corpo humano repleto de pêlos e um focinho de lobo. E alguns nem haviam se dado ao trabalho de se transformar.
Fiz uma carranca para Pierre e Miguel, mas eles pareciam tão surpresos quanto todos nós.
Christopher sabia que os gêmeos iriam traí-lo.
Um homem de cabelos negros deu um sorriso melancólico em direção à Alan, e pela primeira vez, eu o vi esboçar um sorriso de tranquilidade, um sorriso tentando reconfortar o outro. Eu o analisei, era novo demais para ser pai de Alan, e por ser tão parecido, eu diria que ele poderia ser seu irmão. Uma mulher de cabelos brancos segurava-lhe a mão direita, o anel de casamento cintilante deixava claro qual era sua relação com ele.
Um soluço alto saiu dos lábios de Susan. Os olhos arregalados fitavam um homem de cabelos pretos e uma mulher de cabelos castanho escuro lisos e longos, o rosto era tão parecido com o de Susan que era impossível não perceber que eram mãe e filha. A mulher direcionou-lhe um olhar gélido. O homem, provavelmente o pai de Susan e Gregory, nem ao menos havia se dado ao trabalho de dedicar um pouco de sua atenção a ela.
Senti um aperto no coração quando vi a forma como os pais deles reagiram ao vê-los. Não era apenas decepção, eles haviam rejeitado os dois, e apesar de não gostar tanto assim de Susan, eu tinha compaixão por ela, pela maneira como ela havia se sentindo. Só então percebi o quão hipócrita eu estava sendo... Eu estava tratando Irene da mesma forma. Eu não tive tempo de pensar em sentir remorso por isso.
Gregory se pôs a minha frente quando, de supetão, Christopher se transformou por completo. Um lobo preto com falhas no pêlo, mostrando cicatrizes de batalha por todo o torso.
- Se prepare. – Gregory avisou.
Passou rápido, em menos de um segundo, e o lobo de pêlo preto atropelou nós dois, fazendo com que batêssemos em uma árvore de corpo grosso. Gregory segurou a cabeça enorme do lobo com os braços humanos e o jogou longe. Ele logo se recuperou para um contra-ataque, mas Gregory havia se transformado tão rápido que o mesmo nem ao menos havia tido tempo de reagir ao ataque.
Não tive muito tempo para observar a luta dos dois. Uma loba menor havia avançado sobre mim, a boca aberta para me morder. Segurei sua mandíbula e a parte superior da boca, abrindo-a ao ponto de rasgar. O primeiro lobo que eu havia matado naquela guerra. Um segundo lobo havia tentado aproveitar-se da situação, mas eu o havia percebido. Usei minha força para arrastar a loba que ainda segurava para atacar o outro. O lobo bateu na mesma árvore onde Gregory e eu havia batido antes, e antes que pudesse se levantar, girei sua cabeça e quebrei seu pescoço, matando-o.
A árvore partiu-se, acertando outros dois lobos de pêlo acinzentado. Um havia morrido com um golpe certeiro na cabeça, o outro havia se machucado, mas ainda estava vivo e tentava se livrar do tronco que estava sobre ele. Arranquei um pedaço de madeira do tronco, e avancei sobre o lobo que estava preso, cravando a madeira na cabeça do mesmo.
Quatro inimigos a menos.
- Cuidado, Amanda! – Ouvi a voz de Irene.
Olhei para trás a tempo de ver o homem que reconheci como pai de Susan com uma faca pronto para me apunhalar. Meu tempo de reação, felizmente, havia sido rápido. Desviei-me o suficiente para que o ataque não fosse mortal, mas o corte que a lâmina havia feito queimava em meu peito. Irene pulou sobre mim, usando meu corpo de base para se impulsionar e aumentar a velocidade para atacar o homem, fazendo com que eu caísse sentada no chão. Suas mãos se posicionaram sobre os ombros do outro, enquanto girava no ar e segurou a cabeça dele. Antes que seus pés tocassem o chão, um puxão violento da parte de Irene havia arrancado a cabeça do corpo do outro.
Eu a olhei e ela me olhou, os olhos de Irene estavam vermelhos. Ela estendeu a mão para me ajudar a levantar e eu aceitei sua ajuda.
- Acho melhor se transformar agora. – Disse Irene.
- Não precisava avisar. – Respondi.
Em poucos segundos, apenas retalhos do que antes eram minhas roupas estavam no chão. Avancei correndo, impulsionando-me em outras árvores, matando vários lobos no caminho. Reconheci uma loba de pêlos caramelos caída no chão, tentando desviar-se das investidas de outra loba. “Susan...” pensei. Investi sobre a loba, mas ela desviou-se, tentando contra-atacar. Os caninos dela rasparam sobre meu braço, sem que machucasse. Joguei meu enorme corpo sobre o dela e rolamos na grama. Uma árvore impediu que continuássemos a rolar e aproveitei a posição em que estava, sobre o corpo de lobo da outra, para morder seu pescoço, perfurando sua jugular e matando-a instantaneamente.
Um uivo alto da outra loba de pêlo caramelo, Susan, anunciava seu grito dor. Eu a olhei de lado, era necessário, ela sabia disso. Apesar da dor, Susan havia se recuperado e parecia uma máquina de matar. Ela avançou sobre dois lobos inimigos, matando-os com um único golpe e depois avançou sobre outro, matando-o com uma mordida na jugular.
O corpo de outro lobo caiu perto de mim. Rosnei, preparada para atacá-lo, mas o animal já estava morto. Dois lobos de pêlo preto que logo reconheci sendo Miguel e Pierre atacaram outro lobo juntos. Eu logo me lembrei do que Gregory havia dito: Os dois eram inteligentes, mas não eram fortes, somente por isso foram recrutados. Eles lutavam juntos por que lhes era vantagem. Os dois se distanciaram sem nem ao menos perceber minha presença.
Um lobo de pêlo branco e cinza avançou sobre mim foi morto facilmente com um arranhão no pescoço. Um lobo de pêlo branco, Alan, tropeçou sobre mim e nós rolamos uma ladeira com mais dois lobos. Um era branco, como Alan, e o outro era cinza, uma loba fêmea. O lobo cinza me atacou, mas não veio com a intenção de matar. Fiquei em pé nas patas traseiras, desajeitada, e defendi o ataque com facilidade, caindo para trás.
Preparei um ataque mortal, mas o outro lobo branco jogou seu corpo para que eu me afastasse, ficando sobre o corpo da loba cinza, grunhindo. Alan não atacou e ninguém se moveu. A luta continuava mais intensa na parte de cima da colina onde tínhamos caído e somente nós quatro estávamos na parte de baixo. Eu esperei um ataque, mas ninguém queria dar a partida, ou parecia esperar que o inimigo desse a partida.
Estranhei aquilo, irritando-me com a demora. O que eles estavam fazendo? Por que não atacavam? Reconheci o cheiro dos dois lobos. O lobo branco era o irmão de Alan, e a fêmea, provavelmente, a esposa dele. Abaixei um pouco a guarda. Todos estavam relutantes quanto a matar uns aos outros. A loba fêmea levantou-se devagar, o cheiro animalesco tinha um odor adicionado a ele que eu não sabia o que era. Eu a observei, o pêlo era sedoso e bem cuidado, os olhos cor de mel eram intensos, o corpo era elegante... E uma pequena protuberância na barriga.
Ela estava grávida.
Olhei Alan, ele havia percebido isso também. Todos tinham receio pela gravidez dela. Ninguém tinha vontade de lutar, mas todos eram obrigados a isso. Quando cruzei meu olhar mais uma vez com o de Alan, ele entendeu o que eu estava pensando. Avancei sobre a loba mais uma vez e Alan avançou sobre o lobo branco. Enquanto meu corpo diminuía rapidamente, voltando à forma humana, agarrei o pescoço da loba cinza, apertando-o com força, sufocando-a ao ponto de deixá-la inconsciente e depois a soltei.
Olhei a loba no chão, desmaia, e a arrastei por uma das pernas para longe da batalha, certificando-me que ela estaria a salvo dentro de uma árvore de tronco oco. O corpo da loba ia diminuindo à medida que eu a ajeitava dentro da árvore, os cabelos brancos e longo cobriam-lhe o rosto, a pele clara estava escondida sob uma camada de terra e folhas secas, o cheiro camuflado com o da terra. Não demorou muito para que Alan viesse arrastando o outro lobo branco inconsciente pela cauda.
- Obrigado. – Alan disse enquanto ajeitava o corpo do irmão, agora humano, dentro da árvore também. – Eu realmente não queria machucar a Pamella.
- Não há de quê. – Esbocei um sorriso de compaixão.
Corremos de volta para a parte mais alta do bosque. O número de inimigos haviam diminuído e muito. Alan desapareceu de vista quando um lobo de pêlo preto me atacou. Saltei sobre o mesmo, minha mão entrou em sua boca e puxei para fora, arrancando sua úvula e o matando imediatamente. Joguei o lobo sobre outro e corri floresta adentro. Minha maior preocupação no momento era encontrar Gregory.
Andei pela floresta, desviando dos corpos dos lobos até que pisei em uma faca. Apesar de não ter cortado a sola do meu pé, o metal tinha estranhamente me queimado. Grunhi, resistindo à dor. Quando peguei a faca, percebi que não era uma faca qualquer. Era uma adaga de prata, com cabo de madeira nobre desenhado à mão. Isso havia me feito lembrar o que as lendas sobre lobisomens diziam: Eles só podiam ser mortos por uma bala de prata no coração. Olhei a arma novamente. Prata... A adaga de prata que o pai de Susan usara para tentar me matar.
Corri novamente, logo encontrando o lobo de pêlo caramelo ferido no chão e o lobo negro com cicatrizes pronto para finalizar aquela batalha. Gregory iria ser morto. Meu coração falhou uma batida, e nem ao menos tive o tempo necessário para me transformar por completo quando o interceptei. Ele se surpreendeu com o ataque, mas ele se reiterou, preparando um contra-ataque tão rápido que nem ao menos consegui reagir a tempo.
Ele avançou sobre mim, voltando à forma quase transformada e segurou meus braços, impedindo que eu pudesse lhe apunhalar com a adaga. Ele me chutou com força no estômago e eu atravessei duas árvores antes de bater numa terceira árvore. Levantei lentamente, ainda desnorteada com golpe, quando o golpe da lâmina atravessou minha barriga.
Senti todo o meu interior formigar de maneira estranha. A prata queimava dentro de mim, cortando meus órgãos. Ele moveu a adaga, aumentando o estrago, e depois a tirou sem piedade, o sangue abandonando meu corpo. Eu tombei, tentando amenizar o dano colocando minhas mãos sobre a ferida. O corpo do lobo voltava a de tornar humano, os cabelos longos de Christopher ficando em evidência.
- Sabe, senhorita Portland, eu odeio quando me interrompem quando estou fazendo algo importante. – Ele disse. Levantou meu queixo com a ponta da adaga, fazendo arder. – Eu iria matar a senhorita logo depois de acabar com seu querido Gregory, então não precisava ficar tão ansiosa para sua morte. – Ele riu, sarcástico. – Apenas observe enquanto eu acabo com a vida do seu amado Gregory.
- Não! – Gritei, a voz afetada pela dor.
Tentei me levantar, impedi-lo, mas toda a dor que eu sentia, o sangue que estava perdendo, me impossibilitava. “Força!” dizia a mim mesma, mas era muito mais difícil do que eu queria que fosse. Eu o via se aproximar da adaga de Gregory, gritando para que o deixasse, implorando pra que não o matasse. Ele levantou a adaga enquanto o lobo de pêlo caramelo tentava se levantar à todo custo, e preparou a lâmina para perfurar as costas outro quando uma loba de pêlo marrom o atacou e o jogou longe.
A adaga caiu no chão e sumiu no meio do mato selvagem. Eu olhei Gregory, os olhos lacrimejando ao vê-lo voltar à forma humana com um golpe tão profundo quanto o meu no abdômen. A adrenalina corria pelo meu sangue, agora mais forte que nunca, e a ira tomava conta do meu corpo. Minha mente escureceu por alguns segundos, eu nem ao menos sentia meu ferimento.
Os momentos finais passaram-se como slides em um programa de computador. Minha mãe e eu dominando Christopher que tentava sem sucesso se livrar de nós, tentando se transformar em lobo novamente. Irene o segurava pelos braços enquanto eu, montada nas costas dele, puxava a parte superior de sua boca para cima. Eu tentava rasgar sua cabeça, mas ele se mostrava mais resistente que o esperado. Eu temia que não conseguisse matá-lo, aquela podia ser nossa única chance. Se ele conseguisse fechar a boca, eu perderia uns oito dedos.
- Morre logo, desgraçado! – Gritei, usando toda a minha força.
Mais uma mão puxava a cabeça de Christopher para cima, e finalmente conseguimos rasgar sua cabeça. Gregory olhava com um sorriso vitorioso e afetado para mim, carregava a parte superior que havia sido separada do resto da cabeça nas mãos. Pela primeira vez naquele momento, eu me permiti sorrir aliviada, soluçando enquanto chorava de felicidade.
O céu já estava claro quando o resto dos lobos, bem poucos, haviam recuado e todos nós entoamos um grito de vitória. Drew entoou um palavrão, acompanhado de Alan que havia mostrado uma personalidade mais extrovertida que o normal. Irene levantou os braços como uma adolescente animada, jogando-se nos braços de Carl. Pela primeira vez desde que eu havia a reencontrado, eu estava feliz por ela. Gregory me puxou para perto, e eu deixei que ele me envolvesse com seus braços. Ele estava aguentando firme, mesmo com o ferimento profundo. Fechei os olhos quando ele depositou um beijo no topo da minha cabeça. Eu ainda não conseguia acreditar que aquilo havia terminado, e nunca estive tão feliz por causa de uma vitória.
Porém, nem todos estavam felizes com a vitória.
Miguel vinha arrastando um lobo de pêlo preto por uma das pernas traseira. O corpo do lobo tinha mordidas profundas que podiam ser vistas de longe. Toquei o ombro de Gregory, chamando-lhe a atenção. Ele se afastou, amparando o amigo. O grito de fúria e amargura de Miguel ecoou pelo bosque e todos fizeram silêncio, respeitando a dor do outro pela perda do irmão, Pierre.
Mas Miguel não era o único que estava sofrendo.
Os soluços de Susan chegaram alto até nós, apesar de abafados. Ela estava abraçada a uma loba de pêlo caramelo, a jugular rasgada por causa de uma mordida. A minha mordida. Caminhei a passos lentos e pesados até estar próxima ao lobo. Sentei-me na grama alta e selvagem, e não ousei tocar na loba ou em Susan. Eu sabia que deveria dizer palavras de conforto, como qualquer outra pessoa, mas eu só disse o que era necessário.
- Eu precisei fazer isso. – Falei.
Susan sentou-se, ainda soluçando, enquanto limpava os rosto molhado pelas lágrimas. Ela me olhou com os olhos vermelhos e inchados, uma expressão de raiva no rosto.
- Eu sei disso. – Grunhiu as palavras. – Eu devia sentir-me agradecida, mas eu quero, mais do que nunca, acabar com você de vez.
- Eu posso viver com isso. – Respondi, tocando seu ombro.
- Precisamos ir. – Disse Carl.
Todo o grupo se dispersou, tomando seu próprio rumo. Suspirei pesarosa no banco do carona do carro de Gregory. Apesar da doce vitória, eu sabia que não podíamos respirar aliviados por muito tempo. A guarda viria atrás de nós, e nos caçaria até conseguir as nossas cabeças. Mas naquele momento, nós tínhamos a esperança de que um futuro inundado de prosperidade chegaria até nós.
Epílogo
- Vocês roubaram um corpo? – Olhei com os olhos arregalados para Drew e Gregory.
Haviam se passado somente duas horas desde o episódio dentro do bosque, e o noticiário das nove mostrava a ação da guarda florestal, juntamente com os militares que buscavam uma resposta lógica para a guerra que havia sido travada no local. Poucos corpos humanos foram encontrados entre os corpos dos lobos no local, somente a de um homem que havia tido a cabeça arrancada, cuja identidade ainda era um mistério, e uma garota de 1,59 cm, pele negra e cabelos pretos e longos, identificada como Amanda Portland.
Olhei indignada para os dois, apontando acusatoriamente para eles.
- O que vocês têm na cabeça? Como puderam roubar um corpo do necrotério? – Gritei furiosa.
- A gente tinha que simular sua morte de alguma forma. – Gregory tentou se explicar, o torso coberto por faixas aparecia por debaixo da camiseta branca transparente.
- E tinha que roubar um corpo pra isso? – Perguntei, descrente. – E se derem falta dela?
- A gente devolve antes de descobrirem. – Drew deu de ombros.
- Eu não acredito que o único momento em que vocês dão uma trégua é pra fazer um negócio desses! – Bufei, frustrada. – Eu nunca vou entender os homens!
Subi as escadas do segundo andar marchando, deixando os dois para trás. Meneei a cabeça, incrédula. Roubar um corpo? Pra mim, isso era coisa que somente acontecia em filmes. Será que eles não pensam? E se derem falta do corpo? E a família da garota? Como se sentiriam? Caminhei irritada pelo segundo andar até parar perto de uma porta entreaberta. Observei por alguns segundos Susan escovar lenta e melancolicamente os cabelos dourados com uma escova de cerdas brancas. Ela havia me percebido, eu sabia disso, mas ela não havia se dado ao trabalho de me olhar.
Entrei no quarto, postando-me atrás dela, olhando-a através do espelho redondo que a penteadeira possuía. O quarto de Susan tinha paredes e teto rosa, uma cama grande estilo princesa com lençóis de tecido fino e edredons. Era um quarto que toda menina sonhava ter.
- Me dê a escova. – Pedi.
Ela parou de escovar o cabelo, desconfiada. Olhou-me através do espelho por alguns segundos antes de me dar a escova. Suspirei fundo antes de retomar o trabalho que ela havia parado. Empenhei-me em escovar seus cabelos com dedicação, o silêncio que havia se instalado era torturante.
- Eu quero que fique. – Falei finalmente.
Susan arregalou os olhos inchados e vermelhos por causa do choro. Ela virou-se na cadeira, a surpresa e incredulidade estampado na face desenhada.
- Você só pode estar brincando. – A voz rouca de Susan preencheu o quarto. – Eu não vou abandonar meu irmão.
- Ele não precisa que você o proteja mais. – Eu a encarei, o queixo trincado.
- Não pense que só porque você matou alguns soldados da Guarda que você é grande coisa.
- Eu não penso assim. – Confessei. – Mas você tem um novo trabalho aqui, por isso você não pode vir.
Ela franziu o cenho, confusa. Coloquei minhas mãos em seus ombros, girando-a na cadeira. Voltei a encará-la pelo espelho, escovando seu cabelo novamente. Separei uma mecha, começando a fazer um penteado.
- Você ama o meu pai, não é? – Ela baixou os olhos, hesitando em responder, e isso acabou a entregando. Sorri levemente. – Ele vai precisar de alguém que o ajude nos momentos difíceis, que o proteja se alguém ameaçar sua segurança, que o entenda quando estiver confuso e que o ame quando eu me for. – Comecei a trançar a mecha de cabelo. – E você, até onde sei, é a única que pode fazer isso.
O rosto de Susan estava molhado pelas lágrimas. Os soluços começavam a ficar altos enquanto ela, inutilmente, tentava se recompor, limpando o rosto com as mãos.
- Eu... Preciso proteger o Gregory. – Ela sussurrou, a voz afetada, eu diria confusa e indecisa.
- Não. – Falei com a voz firme. – Essa é minha função agora.
Prendi a parte superior de seu cabelo com a mecha trançada. O penteado havia dado a ela um ar inocente, como uma princesa, o cabelo cacheado caindo em cascata pelos ombros e pelas costas. Ela levantou-se da cadeira, encarando-me frente a frente, ficando em evidência o quão diferente nós éramos tanto em personalidade quanto fisicamente. Ela era alta enquanto eu era baixinha; ela tinha busto pequeno enquanto eu tinha um busto avantajado; sua cintura era tão fina que minhas mãos podiam se fechar facilmente sobre ela, enquanto minha cintura era larga; seu quadril era largo enquanto o meu era estreito; sua pele era clara enquanto a minha era negra.
Mas naquele momento, apesar das diferenças, eu sentia que um respeito mútuo começava a se formar entre nós duas.
- Me prometa que irá ficar. – Pedi.
Ela respirou fundo, olhando para um ponto no horizonte antes de me encarar novamente.
- Eu prometo.
Em um impulso, eu a abracei. Ela soltou um gemido de surpresa e ficou sem reação por alguns segundos antes de retribuir o abraço.
- Obrigada. – Falei, com honestidade.
Soltei-a depois de alguns segundos, abandonando o quarto. Quando desci novamente, os garotos não estavam mais na sala. Alan arrastava duas malas grandes para fora da casa, depois voltou para cuidar dos acertos finais. Encostei-me no pilar que havia no meio da casa, olhando-o trabalhar. Eu queria poder ajudá-lo, mas não podia correr o risco de ser vista. Eu o interceptei quando ele trazia uma grande mochila de acampamento.
- E o seu irmão? – Perguntei, curiosa. – Ele conseguiu fugir?
Alan me olhou por um segundo antes de confirmar com a cabeça.
- Ele e Pamella acordaram um pouco antes do restante dos soldados da Guarda se render. – Alan segredou. – Eu tenho que te agradecer... Por ter me ajudado naquela hora.
Maneei a cabeça negativamente, relevando aquele assunto.
- Você não queria machucá-los, eu entendo. – Admiti. – Se fossem meus irmãos, eu iria me sentir da mesma forma.
- Michael ficou arrasado quando eu me tornei um renegado pra seguir Gregory. – Confessou Alan. – Conhecer a Pamella foi o que o fez superar isso.
Ele mirou o chão por um momento, decidindo se revelava mais de sua estória. Eu o olhei, admirada, até o momento em que ele voltou sua atenção para mim. Ele não falaria mais nada, e eu respeitava isso. Ele havia revelado o suficiente, e eu sentia que ele me considerava parte da família agora.
- O importante é que os dois estão bem. – Toquei seu ombro, um sorriso no rosto. – Ânimo!
Ele deu um meio sorriso antes de voltar às suas tarefas.
Olhei para fora, devaneando. Suspirei, um pouco deprimida. Haviam acontecido tantas coisas num curto período de tempo que eu me perguntava como havia sobrevivido a tudo aquilo. Havia chorado, sorrido, gritado de fúria e alegria. Havia feito inimigos poderosos, feito novas amizades, resolvido maus entendidos, encontrado alguém pra amar de verdade... Mas apesar de tudo isso, eu me sentia despedaçada por dentro, pois nada iria cobrir a falta que minhas amigas faria pra mim, a falta que meus irmãos fariam, que o meu pai faria.
Subi as escadas apressada, procurando pelas roupas de ginástica que havia vestido no dia anterior, os óculos escuros e o boné. Saí apressada, correndo pelas ruas movimentadas na velocidade que uma pessoa comum normalmente atingiria. Adentrei minha antiga casa, vizinha ao bosque, e subi as escadas até meu antigo quarto onde peguei, debaixo da minha cama, meu diário com todos os segredos que nunca revelei a ninguém.
Eu olhei o pequeno caderno, devaneando, relembrando todos os sentimentos que senti quando escrevi naqueles pedaços de papel. Raiva, felicidade, tristeza, ansiedade... Todos aqueles sentimentos estavam ali dentro, revelando segredos que ninguém mais sabia. Peguei mais algumas coisas de valor sentimental que queria levar comigo quando fosse embora antes de refazer todo o trajeto de volta para a casa de Gregory.
Subi as escadas para o segundo andar, encontrando Susan em seu quarto mais uma vez.
- Posso te pedir mais um favor? – Perguntei.
Ela me olhou com os olhos cerrados, desconfiada, enquanto meu sorriso aumentava cada vez mais.
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- Você vai ficar? – Gregory e Alan falaram em uníssono, surpresos com a revelação de Miguel.
Miguel jogava em um Playstation portátil um jogo qualquer, encostado em sua moto, quando disse que iria ficar em Somerset. Estávamos dentro da garagem da casa de Carl preparando os últimos detalhes da partida. “Irei comprar um apartamento perto da escola”, ele falou, “Eu não tenho nenhum lugar pra ir, e tenho motivos pra ficar.” Sorri quando ele disse aquilo. Mesmo com o tom de descaso na voz, eu sabia qual era o seu motivo, e ela se chamava Jennifer.
- E o que você vai dizer pras garotas sobre o Pierre? – Gregory perguntou.
- Eu digo que o visto dele foi revogado e ele teve de voltar urgente pra França. – Ele deu de ombros. Ele disfarçava a dor que sentia pela perda do irmão com o tom de descaso. – Depois falo que ele sofreu um acidente e o resto eu penso depois.
- E quanto ao Christopher? – Perguntou Alan.
- Eu digo que foi com ele. – Ele respondeu. – Ele me deixou emancipado e foi com o Pierre resolver a documentação na embaixada francesa. Elas vão acreditar.
Eu os deixei conversando a sós e entrei. Caminhei a passos lentos pelo corredor que dava para a sala, passando pelas escadas sem subir para o segundo andar e atravessei a sala de jantar. A casa parecia estranhamente quieta. Olhei para os lados, observando a decoração. Os sofás escuros na sala e as paredes rubras davam um ar másculo ao ambiente. A lareira de tijolos castanhos e vermelhos nunca havia sido acesa quando eu visitava a casa, mesmo no natal.
Ouvi som de passos se aproximando na direção da cozinha. Virei-me, olhando os recém-chegados. Irene e Carl se aproximavam, alheios à minha presença, as mãos entrelaçadas, envoltos num meio abraço. Não demorou muito para que me percebessem. Carl olhou para mim, eu não pude decifrar o que pensava, ele apenas depositou um beijo rápido na bochecha de Irene e saiu. Estávamos somente Irene e eu na sala, e nos encarávamos, esperando que uma das duas desse a partida, sem ceder àquele combate interno.
Desviei o olhar, olhando para o chão como se algo interessante estivesse grudado no chão de tábua corrida, suspirando fundo em seguida.
- Amanda, eu... – Ela começou, mas a interrompi com um gesto de minha mão.
- Me desculpe. – Fui sincera. – Eu fui egoísta. Eu só pensei na dor que meu e eu sofremos quando você partiu, e me neguei a reconhecer que havia sido difícil pra você também. Amar alguém de longe machuca, abandonar e magoar quem você ama também. – Eu olhei para ela e vi lágrimas em seus olhos. – O sacrifício que você fez... Muitas pessoas não abririam mão de tudo o que amam pra protegê-las por egoísmo. Eu percebo isso agora, pois eu vou fazer a mesma coisa. – Inspirei fundo, soltando o ar de uma única vez. – Muita obrigada por tudo o que você fez por mim.
Ela sorriu, tentando segurar as lágrimas de emoção. Limpou as lágrimas com as mãos, tentando inutilmente se recompor.
- Oh, minha filha... – A voz saiu chorosa e afetada pela emoção.
- Eu tenho orgulho de te chamar de mãe. – Confessei.
Ela me abraçou forte, desistindo de segurar as emoções. Os soluços vinham altos, acompanhados das lágrimas. Eu retribuí o abraço, fazendo um pequeno cafuné em sua cabeça.
- Eu amo você, filha. – Ela disse, depois de alguns minutos.
- Também amo você, mãe. – Meu coração ficou acelerado e eu a abracei ainda mais forte.
Mirei a pequena platéia que havia se formado na sala. Os quatro homens da casa – Carl, Drew, Alan e Gregory – assistiam à nossa reconciliação. Carl em particular, exibia um meio sorriso satisfeito nos lábios. Ergui uma sobrancelha como se dissesse “É melhor cuidar bem dela.” E ele retribuiu com uma bufada disfarçada de riso. Gregory tinha um sorriso aberto nos lábios, os sentimentos que eu sentia refletidos nos olhos dele. Soltei Irene que voltava a limpar o rosto molhado pelas lágrimas.
- Chega de enrolar, vocês precisam ir agora. – Ela declarou, se recompondo. Ela voltou-se para Gregory por um segundo. – O carro está pronto com tudo o que vocês precisam.
- Certo, sogrinha! – Gregory brincou. – Vamos indo, Sam.
Ele apressou o passo, tomando meu braço e me guiando para a garagem da casa de Carl. Gregory entrou no Mustang azul marinho no lado do motorista, enquanto eu dei a volta e entrei no lado do passageiro. Ele procurou a chave no bolso e a colocou na ignição, ligando o carro, mas antes que desse a partida, a cabeleira negra de Drew apareceu na janela do meu lado.
- Hey! – Ele chamou a atenção de Gregory, atiçando minha curiosidade. – Não esquece o que eu te falei.
- Fica frio. – Ele disse, então sua atenção se voltou para mim. – Eu vou cuidar bem dela.
- Hey! – Elevei a voz, indignada. – Não aja como o irmão super protetor agora. – Reclamei. – Não depois de nutrir dezesseis anos de ódio contra a minha pessoa.
Ele ergueu uma sobrancelha, e eu percebi naquele momento o quão parecido éramos em personalidade, mesmo que não estivesse estampado na cara.
- Cala a boca, pirralha. – Arregalei os olhos diante daquele comentário, indignada. – Eu só não quero que todo o trabalho que tive pra te proteger, mesmo contra a minha vontade, seja desperdiçado se você morrer.
Bufei, mas permiti que um sorriso se apossasse do meu rosto. Levei uma mão ao rosto de Drew e depositei um beijo carinhoso em sua testa.
- Eu também te amo, irmão. – Ele arregalou os olhos, mas se recompôs do susto. Não disse nada e saiu, mas tive a impressão de que sorria quando abandonou a garagem.
Quando a porta da garagem se abriu, o som dos pneus cantando fora a primeira coisa que ouvi assim que abandonamos a casa de Carl. Gregory dirigiu em velocidade alta, passando pelo hotel onde estávamos hospedados, o cinema que ficava do outro lado da rua e pegando a estrada que levava até a nossa escola. Estranhei aquele caminho, mas quando ele virou o carro em uma esquina, eu reconheci de imediato o trajeto que ele fazia. As árvores altas do bosque tomaram a rua, e por um momento, eu relembrei todos os bons e maus momentos que aquele lugar havia me dado. Passamos pela sua casa e depois viramos na rua da minha casa.
Gregory estacionou o carro do outro lado da rua. Eu o olhei interrogativa, vendo-o abaixar um pouco o vidro de sua janela.
- Eu achei que você iria querer ver seu pai uma última vez. – Ele falou.
E então meu saiu de dentro de casa, os gêmeos ao seu lado. Os soluços inundaram o carro, o choro era iminente. Susan vinha logo depois dele, o meu diário em mãos. O rosto abatido de meu pai fazia meu coração pulsar mais forte. Quando Susan o abraçou, ele se permitiu finalmente chorar. Eu agradeci mais uma vez por Susan estar ali para ele. Ela entregou meu diário para ele, dizia algo que eu não pude escutar, e depois se despediu. Ele chamou um táxi logo em seguida e se foi também.
Eu tentava controlar os soluços, amparada pela mão quente e acolhedora de Gregory em minha cabeça, que fazia um breve cafuné. Eu o abracei desajeitada, sendo retribuída, até me acalmar e conseguir me recompor. Ela fez um carinho em meu rosto antes de ligar o carro novamente e dirigir em alta velocidade pelo caminho em que havíamos pegado. Passamos pelo bosque, a escola, mas ao invés de virar à esquerda, ele foi em frente. Passamos pelo corpo de bombeiros da cidade, depois pela floricultura da família de Sabrina.
Agitei-me no banco ao ver Angela, Jennifer e Sabrina sentadas na porta da floricultura, meus olhos voltando a encher de lágrimas ao ver Jennifer e Sabrina amparando uma Angela inconsolável. O carro de Gregory virou outra rua e as perdi de vista, finalmente pegando a estrada principal que levaria a saída da cidade. A placa de “Você está saindo de Somerset!” marcava os limites da cidade.
Meu coração aquietou-se quando, em um momento de devaneio, eu me lembrava de todas as amizades feitas, os inimigos poderosos que derrotei, os maus entendidos que haviam se resolvido... O amor que eu tinha encontrado. E eu levaria todas as lembranças e sentimentos que descobri e fiz nos últimos dois meses comigo para além, em um lugar que pertenceria somente a mim... E a ele.
Última modificação feita por SaaChan (28-04-2015, às 20h39)
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#4 11-03-2015, às 18h22
Última modificação feita por SaaChan (09-05-2015, às 17h15)
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#5 11-03-2015, às 20h01
Estava esperando você reservar pra eu vim comentar, hehe. Menina, essa fic promete! Tava fuçando o tópico de sugestões para fics e me deparei com essa fic. Fiquei torcendo pra que aceitassem! Me apaixonei.
Estou extremamente curiosa para saber o que tem na caixa que Greg deu pro garoto... O Greg é lobo né? Ele come carne humana? o.O A primeira coisa que eu pensei que teria na caixa seria dedos. Sou doida, liga não. o.O
Eu me assusto comigo as vezes.
Estarei acompanhando sua fic com toda a certeza!
Aguardo o próximo capítulo.
Beijokas!!
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#6 11-03-2015, às 20h28
Ela já foi popular, só estou reenviando. É que na época em que eu estava escrevendo, eu estava tããããão atarefada (foi no ano que meu sobrinho nasceu, e eu entrei no ensino médio - tive doenças, passei por cirurgia e tudo o mais, mó loucura pra conseguir me adaptar à tudo). Mas como eu estava escrevendo duas versões diferentes à mão e acabava trocando tudo, eu tive que revisar tudo e mandar de novo, mas com um novo título e novos personagens. Mas já faz tanto tempo que o pessoal nem deve se lembrar mais da minha fic.
Ohgosh! \o/ Esqueci de revisar de novo essa parte x.x' Eu sempre passo direto e esqueço de tirar kkk nem me lembro mais do por que coloquei (acho que era por que era pra ser fic de vampiros xOOOO).
Mas até que seu pensamento não foi doido não, eu já li isso acontecendo no mangá Wolf Guy (os personagens da capa são desse mangá, se quiser saber haha), só que o cara que comeu os dedos era um humano comum e o cara que teve os dedos cortados era o lobisomem. 0-0 #Azideiadessemangacara...
Nhaaa, próximo capitulo estará disponível amanhã (mas se a curiosidade te matar, pode ler nesse link aqui, com os personagens de AmorDoce.
www.amordoce.com/forum/t28310,1-nathaniel-destinos-por-saachan.htm#p4568507)
Thnks fr th rvw!
Última modificação feita por SaaChan (11-03-2015, às 20h28)
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#7 12-03-2015, às 14h05
Masgenti!!! O cara comeu dedos de lobisomem? OxO C-H-O-Q-U-E-I! Não sei porque, mas tô com vontade de rir disso. Ô ceninha nojenta que imaginei... KKKKKK'
Se algum dia eu conhecer alguém que não goste de lobisomem, vou deixar meus dedos bem longe desse ser. Vai que... o.O' Dexa queto...
Era pra ser fic vamp? Que top... Mas, se fosse, a caixinha não teria muito sentido. Ou talvez tivesse... Podia caber bolsa de sangue, lá... Vai saber.
Não acredito que ela não curiou pra saber o que tinha dentro. Se fosse eu, empurraria Greg e falaria: "Licença, sou curiosa... OMG! Isso é... Dedos?" kkkkk' #parey
Enfim, se depender de mim, a fic vai ser popular de novo! Porque eu amei. *-*
Resolvi esperar você postar o capítulo mesmo, a preguiça é muita, sabe? Você vai postar um cap. por dia?
U r welcome! *-*
Última modificação feita por Liyarah (12-03-2015, às 14h08)
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#8 12-03-2015, às 23h16
ahuehue acho que é capaz de eu nem mostrar o que tem na caixa. XD eu ia excluir essa parte. Huehue, vamos fazer um manifesto pela priteção dos nossos dedos!
Yeah, lady, era pra ser uma fic de vamp, mas nem me lembro mais por que eu mudei. Acho que ficou até melhor assim. Eu ja ficaria maisbna minha, sou curiosa, mas sei respeitar a privacidade dos outros xp
Eu ia postar hoje por que o cap 2 ja foi todo revisado, mas como o pessoal do meu grupo de estudos veio aqui em casa pra poder fazer o blog de filosofia como trabalho, eu nem tive muito tempo de entrar. Na verdade estou escrevendo pelo tablet agora.
Mas quando eu tiver tempo de entrar no pc, eu posto a fic e te aviso.
O/
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#9 13-03-2015, às 23h57
Tendi. Não tenho pressa pra ler (talvez um pouquinho), mas desde que você poste...
Enfim, absolutamente adorei. *-*
A mãe dela ainda vai aparecer? Acho que é triste eles ficarem sem mãe. Tadinhos dos gêmeos! Gosto de gêmeos porque tudo fica mais zoado com duas cópias kkkk'
Me avisa quando sair o próximo? \õ/
Última modificação feita por Liyarah (13-03-2015, às 23h57)
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#10 14-03-2015, às 00h03
I'm happy! Obrigada por ser tão compreensiva, você é um amor! Acho que vou até postar o capítulo 3 agora pra ficar sincronizado com o fórum do AmorDoce.
A mãe deles é um item à parte, veremos isso depois
Vou mandar o próximo agora mesmo, só deixa eu pegar o texto aquii \o
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#11 14-03-2015, às 00h48
OMG! Que tenso!
Será que era o Greg? Eles são lobisomens? Não se controlam a noite?
Tô super curiosa.
*-*
Avise-me quando postar o próximo!
<3
Última modificação feita por Liyarah (14-03-2015, às 00h49)
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#12 14-03-2015, às 00h54
haha não vou te contar! XP
Vou avisar sim, pode deixar O7!
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#13 14-03-2015, às 09h59
Adoro Fanfic's , e a sua certamente me agradou, todos os elementos de suspense estão incríveis, dignos de uma grande escritora. Estou amando imensamente, e estou doida para descobrir se aquele lobo que a Maddy viu no bosque, é o personagem Gregory.
Parabéns pela fanfic! ❤❤❤
❤❤❤
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#14 14-03-2015, às 19h42
Oh, mais uma leitora! \o/ I feel better now.
(Oh, God, que comentário lindo!) Oh, mas sobre o lobo... Isso é segredo! x.x Só acompanhando pra saber.
Estarei postando o capítulo 4 em cinco minutinhos, ladies.
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#15 14-03-2015, às 21h53
OMG! O Q-U-E F-O-I I-S-S-O? Vinicius? Ahn?
To prevendo... To prevendo... Confusão! *o*
Esperando ansiosamente o próximo capítulo.
Só uma dúvida: você já tem a fic planejada na mente ou escreve tudo na hora? *o*
Tá per-fect a fic! <3
P.S.: Me dá um lobo?
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#16 14-03-2015, às 22h04
Quando eu comecei a escrever a fanfic, foi tipo, na hora, sem planejamento, só usando a criatividade. Eu sou muito ansiosa com as coisas, então eu escrevo sem planejar nada. Então, quando eu ia postando, eu percebia que acabava deixando uns errinhos de continuação cá e lá, e acabava colocando mais coisas pra preencher esses espaços. Ai, virou essa fanfic.
Agora eu estou voltando à postar, então já está a maioria dos capítulos escrito e feito. Só preciso concluir, e até lá, eu ainda vou estar postando os meus capítulos
Ps.: Te dou o Akira, você quer? xDDDD
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#17 14-03-2015, às 22h09
Ah, tendi. Quando eu escrevia, era só na base da criatividade também, mas como você disse, ficava vários lapsos... Quantos capítulos você já tem feito? *-*
Quero, opa! Passa pra cá, hehehe'. *o* <3
Última modificação feita por Liyarah (14-03-2015, às 22h16)
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#18 14-03-2015, às 22h26
Eu tenho tenho 9 capítulos prontos. Vou finalizar com 10 e adicionar um epílogo.
Ps.: Toma aí \oSpoiler (Clique para visualizar)
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#19 15-03-2015, às 22h31
OMG! THANKS! <3
Eu amei ele! *-*
Amei os gêmeos, porque gêmeos são fodas!
O que é uma mestiça? A audição dela tá mais aprimorada ou ela ouviu a fofoca do povo porque tava perto?
Será que ela também vai virar loba?
Amei o capítulo!!! \õ/ Não se incomode em responder minhas perguntas, não quero spoilers, mas é só pra saber o quanto estou curiosa! *-*
Aguardarei o próximo. ❤
Última modificação feita por Liyarah (15-03-2015, às 22h33)
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#20 16-03-2015, às 15h12
Que FanFic perfeita!!! Parabéns, está muito bem escrita fora a criatividade digna de uma verdadeira escritora. Vou continuar acompanhando, beijos!
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#21 21-03-2015, às 17h29
Desculpe a ausência, meninas, eu estive doente esses dias. Parece que uma epidemia se espalhou pela região aqui de Vista Alegre e Irajá, e muita gente pegou uma virose braba. Felizmente, pra mim foi só imunidade baixa, mas a minha irmã foi quem ficou mais doente e meu sobrinho de 2 anos também ficou doentinho.
Só passando pra avisar que eu vou postar o próximo capítulo mais tarde, então não se preocupem, por que eu não abandonei a fanfic.
Última modificação feita por SaaChan (21-03-2015, às 17h30)
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#22 21-03-2015, às 23h13
OMG! Tu tá melhor? *o* Espero q sim.
Amei os capítulos. Estou ansiosa para os próximos, pq os segredos serão revelados, não?
O que será que a Maddy é? *o*
OMG! Quando postará o próximo? Mais tarde? EBAA! \Õ/ *---* <3
Última modificação feita por Liyarah (21-03-2015, às 23h20)
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#23 23-03-2015, às 06h45
Que Fanfic diva!!!
Amei ler os capitulos e espero que continues a postar!
Achei o título muito chamativo!
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#24 24-03-2015, às 14h56
Uhul! Mais uma leitora \o/
Pessoal, eu vou postar aqui só pra dar afirmação da continuação, eu percebi que sempre que eu vou conversar, eu acabo dando sempre um spoilerzinho pra vocês haha xDDD
Bom, eu vou postar o próximo capítulo em breve, então fiquem atentas, hein. Irei avisá-las. Beijinhos.
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#25 29-03-2015, às 15h39
Eu amei a fanfic, é totalmente original!
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